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COLUNA

Ainda dá tempo de falar sobre a Barbie?

Barbie. - Imagem: Reprodução
Barbie. - Imagem: Reprodução
Kleber Carrilho

por Kleber Carrilho

Publicado em 05/08/2023, às 06h42


Na semana passada, assisti aos dois filmes que estão movimentando as salas de cinema, além das redes sociais: Barbie e Oppenheimer. Gostei de ambos, mas não é isso o que quero destacar aqui, até porque não sou crítico de cinema. Minha intenção é falar sobre os radicalismos políticos que impedem que se veja o mundo sem os filtros da influência das bolhas.

Pois bem, Barbie é um bom filme. Faz uma crítica ao machismo que toma conta da sociedade, demonstra a incapacidade de grande parte dos homens de lidar com a ausência de protagonismo, serve como referência para as novas gerações, para que elas se lembrem do mundo em que a boneca ganhou relevância. Mais do que isso, é um roteiro que trabalha com questões extremamente importantes, como a relação entre mãe e filha, e abre uma discussão sobre a morte como presença mental. Afinal, é o pensamento sobre a morte (e a fala sobre ela durante a festa) que se torna o principal motivo pelo qual a Barbie vai ao mundo real. Lembram-se?

O problema é que, com a discussão político-ideológica, que questiona se existem ou não valores cristãos no filme, se a Barbie é o demônio anti-homem, além de tudo aquilo que você vê por aí, as questões que poderiam trazer reflexões importantes, como a ideia da morte, da relação entre as gerações e das possibilidades de se discutir papéis sociais, se perdem.

O movimento de pastores, influencers e líderes políticos proibindo ou pregando para que as pessoas não assistam simplesmente porque os valores não são os que devem ser defendidos por pessoas de bem, os famosos defensores da família, lembra que estamos cada vez mais perto dos fundamentalismos dos quais acreditávamos que o mundo ocidental tinha se afastado.

E, quando a gente observa que esses ressentimentos estão cada vez mais presentes, faz todo o sentido assistir ao lançamento de Oppenheimer acontecendo ao mesmo tempo. Afinal, além de tentar retratar a vida do pai das bombas atômicas, ele serve para mostrar que não faz muito tempo que a humanidade foi ao extremo para defender a democracia liberal, quando ela ainda era motivo de defesa.

Atualmente, os fundamentalismos tomam conta de muitos lugares, com muito mais gente querendo bombas atômicas para calar os discordantes do que se preocupando em desenvolver defesas de argumentos que não exijam a proibição de filmes ou livros.

E, só para não deixar de lado uma análise sobre Oppenheimer, só consegue criticar o filme quem nunca teve dilema profissional ou político na vida. Afinal, entender a importância de uma ação e ter que conviver com a culpa devido aos danos que ela resultou é algo real para muita gente. Então, está tudo bem ter desenvolvido a bomba e se sentir culpado depois, mesmo que seja só de vez em quando. Oppenheimer, apesar de um gênio, era também humano. E, para mim, o filme dá conta disso muito bem.

Por fim, só para lembrar, cinema é arte, e por isso serve para incomodar. Podemos concluir que os dois filmes fizeram isso muito bem.

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