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Sem clube, Rosângela Santos dirige em aplicativos e cogita adeus às pistas: “Cansada”

No início, as corridas pelo aplicativo serviriam apenas como um complemento de renda. Ao voltar das Olimpíadas de Tóquio, Rosângela Santos decidiu trabalhar

Sem clube, Rosângela Santos dirige em aplicativos e cogita adeus às pistas: “Cansada”
Sem clube, Rosângela Santos dirige em aplicativos e cogita adeus às pistas: “Cansada”

Redação Publicado em 03/11/2021, às 00h00 - Atualizado às 18h13


Medalhista olímpica em Pequim, velocista lida com falta de recursos para conseguir treinar e se preparar para mais um ciclo até Paris: “Depois de 21 anos no atletismo, passar por isso?”

No início, as corridas pelo aplicativo serviriam apenas como um complemento de renda. Ao voltar das Olimpíadas de Tóquio, Rosângela Santos decidiu trabalhar como motorista para ajudar nas despesas de casa. No meio de outubro, porém, foi dispensada pelo Pinheiros e se viu sem alternativas. Bronze com o revezamento em Pequim 2008, a velocista faz as contas e se pergunta: ainda vale a pena ser atleta?

A rotina tem sido intensa. Rosângela mora em Madureira, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Todos os dias, acorda cedo e se desloca para a Urca, onde treina em dois períodos, entre 8h30 e 11h30. Depois do almoço, faz musculação. De lá, volta para casa, descansa um pouco e dá início ao trabalho como motorista. Por pelo menos quatro horas, dirige pela cidade antes de encerrar.

Rosângela Santos em treino em Tóquio — Foto: Wander Roberto/COB

Rosângela Santos em treino em Tóquio — Foto: Wander Roberto/COB

Nos Estados Unidos, onde morou por um tempo, Rosângela também trabalhou como motorista de aplicativo enquanto se preparava para as Olimpíadas de Tóquio. Na época, sofreu uma lesão nas costas por passar tanto tempo sentada e viu ruir seu planejamento de treinos. Agora, com a obrigação da dupla jornada para conseguir se sustentar, cogita se aposentar do atletismo para se dedicar apenas ao aplicativo.

– Eu estou me sentindo bastante cansada. Treino de manhã, de tarde. Começo a dirigir por volta de 17h e tento ir até umas 21h, 22h, porque no dia seguinte tenho que treinar de novo. Você acha mesmo que, desse jeito, para conseguir uma medalha olímpica vai dar muito certo? Acha mesmo que vale a pena? Depois de 21 anos no atletismo, passar por isso? Não está valendo mais ser atleta. Muito mais fácil focar em ser motorista de aplicativo – desabafa a atleta, de 30 anos.

O fim do contrato com o Pinheiros pegou Rosângela de surpresa. Há sete anos no clube paulista, a velocista costumava firmar contratos anuais com a equipe. Neste ano, por conta da pandemia, o período foi menor, mas com a expectativa de assinatura de um aditivo após as Olimpíadas. No dia 14 de outubro, porém, o empresário da atleta foi comunicado de que o vínculo seria encerrado naquele momento. O ge entrou em contato com a assessoria do clube, mas ainda não recebeu resposta.

– Ninguém entrou em contato. Foram sete anos de clube. Desses sete anos, só esse ano, que eu tive uma lesão na panturrilha, que eu não consegui correr o Troféu Brasil. Em todos os outros anos, ganhei medalha. Se não venci, fiquei em segundo ou terceiro lugar.

Hoje, Rosângela conta apenas com o Bolsa Atleta e com um patrocinador. Não é o suficiente para bancar a rotina de treinos e viagens para competições. Seu técnico, Renan Valdiero, tem ajudado como pode. Sem salário fixo, recebe uma parte das premiações das provas que Rosângela disputa.

Rosângela Santos fecha o revezamento 4x100m brasileiro na Olimpíada de Pequim 2008 — Foto: Tim De Waele/Getty Images

Rosângela Santos fecha o revezamento 4x100m brasileiro na Olimpíada de Pequim 2008 — Foto: Tim De Waele/Getty Images

A velocista tem como principal objetivo o Mundial Indoor, em Nanquim, na China, em março do ano que vem. Depois, ainda não decidiu o que vai fazer. Não sabe se terá condições de disputar o Mundial aberto, em julho, em Oregon, nos Estados Unidos. Sem apoio, deixar as pistas e se dedicar à carreira nos aplicativos é uma opção.

– Meu objetivo é Mundial Indoor, já estou classificada. Não sei como vai ser pista livre. Meu planejamento, agora, é até março. Estou tentando me reerguer, estou tentando criar motivações no atletismo. Porque cansa. Já estou cansada, até porque faço isso há 21 anos. Tenho artrose no quadril, dói muito. Faço infiltração para controlar. Vale a pena? Além de ter lidar com lesões, lidar com isso. A falta de investimento é natural do esporte, já estamos acostumados. Essa falta de respeito foi o pior. Se já tivessem avisado que não renovariam o contato, teria esse respaldo, iria atrás de outras coisas.

A procura de Rosângela vai além de um clube. Sem tantos investimentos, sabe que poucas são as equipes com condições de investir em salários de atletas olímpicos. Por isso, se apega à espera por patrocinadores que possam ajudá-la no ciclo até Paris.

– Se patrocinadores se sensibilizarem, agradeço muito. Poderia até me vincular a um clube com recurso menor, mas com a ajuda de uma empresa privada. Isso já aconteceu comigo. Se isso acontecer…

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Globo Esporte

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