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As Fake News são tantas que todo dia parece 1º de abril

As Fake News são tantas que todo dia parece 1º de abril - Imagem: Freepik
As Fake News são tantas que todo dia parece 1º de abril - Imagem: Freepik
Amilton Augusto

por Amilton Augusto

Publicado em 03/04/2023, às 08h20


No Brasil, o dia 1º de Abril é conhecido como dia da mentira e, embora todos tenham esse conhecimento, muitos não sabem a origem desta “data comemorativa”. À título de curiosidade, acredita-se que a data tenha surgido na Europa, mais especificamente na França, quando o país era governado pelo Rei Carlos IX e vigorava o calendário juliano e, neste, o Ano Novo era comemorado do dia 25 de março até 1º de Abril. Foi, então que, com a mudança do referido calendário, em 1564, para o que conhecemos hoje, por resistência, muitas pessoas continuaram a celebrar o Ano Novo em 1º de Abril, sendo ridicularizadas por isso, zombaria que evoluiu para a prática de pregar peças e contar mentiras, tornando-se, então, uma tradição popular.¹

Por sua vez, no Brasil, a “comemoração” do dia da mentira teve início em 1828, quando o noticiário impresso mineiro “A Mentira” estampou na capa da sua primeira edição a morte de Dom Pedro I, publicação que ocorreu justamente no dia 1º de abril, partindo daí o que conhecemos acerca desse dia que, nos dias atuais, muita gente tenta ressignificar, especialmente, para as nossas crianças, data que nos remete a uma das maiores mazelas de nossa atualidade, principalmente, diante do avanço das novas tecnologias, as Fake News, com grande destaque para âmbito político e eleitoral.²

Há algumas eleições que a Justiça Eleitoral vem se debruçando sobre esse tema, com enorme preocupação e com bastante atenção, principalmente depois das Eleiçõesde 2018, que é a difusão indevida e em massa de inverdades com o fim de realizar propaganda negativa contra adversário ou positiva em benefício de candidaturas e políticos, o que se convencionou denominar de Fake News, o que decorre, pelo menos no âmbito digital, do impacto das novas tecnologias colocadas a serviço da política e do processo eleitoral.

Embora fake news seja um tema de grande discussão no momento atual que o Brasilatravessa, sendo causa primárias das principais ações em tramitação no Tribunal Superior Eleitoral e, para além disso, trazendo grande preocupação para as autoridades, aliada ao avanço das tecnologias de realidade virtual e inteligência artificial, justamente, como dito, pelo impacto no processo eleitoral, devemos destacar que a mentira na política não é atual, já estando em nosso meio há pelo menos um século, sendo que a diferença entre o modelo do passado e o da atualidade é tão somente a utilização das novas tecnologias, bastando buscar na história para encontrarmos inúmeros casos, o que incluía personagens ilustres como D. João VI e demais membros da família real.

Para se ter ideia do quanto a mentira ronda a política nacional, embora em outras proporções, por exemplo, nas eleições de 1945 getulistas espalharam que o então candidato de oposição, Eduardo Gomes, seria contra os trabalhadores, os negros, os pobres e as mulheres que trabalhavam fora de casa, o que foi o suficiente para desconstruir a sua campanha e eleger o então general Eurico Gaspar Dutra. Outro caso bem interessante, e bem mais recente, deu-se no Rio de Janeiro durante a campanha de 1996, revelado no livro “Política é ciência”, do ex-Prefeito César Maia, que durante a campanha ajudou a eleger Luiz Paulo Conde, utilizando-se do artifício de colocar diversas pessoas em bares espalhando o boato de que o então adversário, Sérgio Cabral, renunciaria.

Tais fatos demonstram claramente o impacto das notícias falsas no processo eleitoral e a importância da preocupação da Justiça Eleitoral com a questão, o que, por certo, levou a decisão, durante o julgamento do processo da chapa Bolsonaro-Mourão das eleições de 2018, assim como no processo de cassação do deputado Fernando Francischini, de enfatizar e reconhecer a caracterização do abuso de poder econômico e/ou do uso indevido dos meios de comunicação na disseminação em massa de notícias falsas com o fim de prejudicar candidatos opositores ou em benefícios de candidaturas.

Em síntese, durante o julgamento da chapa Bolsonaro-Mourão, sobre supostas ilicitudes praticadas durante as eleições de 2018, o Tribunal Superior Eleitoral, embora julgando improcedente a ação, reconheceu a prática ilícita da disseminação de mensagens em massa em benefício das candidaturas vencedoras e em detrimento e prejuízo das campanhas dos adversários, não reconhecendo, no entanto, a existência de correlação entre tais ilícitos e a própria campanha, decisão que, certamente, servirá de precedente e subsidiará as futuras decisões da Justiça brasileira acerca do tema.

Tamanha gravidade de tais fatos no processo eleitoral e na própria política que a Justiça Eleitoral se mostrou extremante atenta a tais fatos durante a campanha eleitoral das eleições de 2022, tanto que, antes do início do período eleitoral, como forma de desestimular esse tipo de prática abusiva, mais de uma vez, os ministros do TSE e do STF, com especial destaque para o E. Ministro Alexandre de Moraes, atual Presidente do TSE, enfatizou que todo aquele que praticar tais condutas, disseminando fake news durante o processo eleitoral, seria cassado e preso por ofensa à lisura e moralidade das eleições e à própria democracia, com o intuito de preservar a plena liberdade de expressão e o equilíbrio na disputa eleitoral e política.

Por certo que a defesa da democracia contra todo tipo de mentira, para além do significado da comemoração do tradicional dia da mentira, deve ser contundente durante todo o ano, não somente contra fake news, mas contra todo tipo de abuso, em especial, por certo, contra a prática condenável e repulsiva da divulgação de notícias falsas com o fim de prejudicar ou beneficiar pessoas, reputações ou candidaturas, devendo, sim, não somente ser processada e julgadas dentro da seara eleitoral, mas, por certo, como forma de garantir a paz social, criminalizada, uma vez que não há justificativa plausível que fundamente essa prática que, em primeiro lugar, prejudica diretamente o cidadão-vítima em sua essência, e, em segundo, atinge o próprio processo democrática.

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¹ https://querobolsa.com.br/revista/dia-da-mentira-comemorado-1o-abril-entenda-por-que

² Idem.

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