A aracnofobia e a homofobia dão nome a medos e ódios muito difundidos na história da humanidade. A aversão à pobreza também é histórica, mas só ganhou nome
Redação Publicado em 10/12/2021, às 00h00 - Atualizado às 07h37
A aracnofobia e a homofobia dão nome a medos e ódios muito difundidos na história da humanidade. A aversão à pobreza também é histórica, mas só ganhou nome próprio há cerca 20 anos. De origem grega, a aporofobia se refere ao medo e à rejeição aos pobres.
A palavra passou a ser difundida recentemente no Brasil com uma campanha do padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo da Rua, de São Paulo, contra as cidades que a praticam. Ele conta que recebeu centenas de imagens de aporofobia no país.
Um cartaz da Prefeitura de Pato de Minas, por exemplo, em que se lê “Não dê esmola, dê cidadania” , levou uma tarja preta do padre Júlio: aporofobia. Foto de grades rentes a um imóvel comercial em Salvador, na Bahia, para impedir a dormida de moradores de rua, também foi marcada com a tarja pelo religioso. Bem como a imagem de um viaduto com pedras em Santo André, no ABC Paulista.
Padre Júlio Lancellotti removeu pedras sob um dos viadutos de SP. — Foto: Vivian Reis/G1
Em fevereiro, padre Júlio marretou os blocos de paralelepípedos instalados pela gestão do então prefeito Bruno Covas (PSDB) na parte inferior de viadutos na Zona Leste da capital.
Por isso e por toda a luta ao lado dos pobres em São Paulo, um projeto de lei que proíbe técnicas de construção hostil e restringe o uso do espaço público leva o seu nome. A Comissão de Desenvolvimento Urbano, da Câmara dos Deputados, aprovou em, novembro, o projeto de lei “Padre Júlio Lancellotti”.
O texto ainda precisa passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e pelo plenário para ser aprovado.
Situações muitas vezes classificadas como “racismo” ou “xenofobia” deveriam ter, na verdade, outro nome: “aporofobia”. Este é o argumento da inventora da palavra, a filósofa espanhola Adela Cortina, que a criou nos anos 1990. De acordo com ela, há casos em que o ódio a imigrantes ou refugiados, por exemplo, não decorre da condição de estrangeiros, mas, sim, da situação de miséria em que essas pessoas se encontram.
O termo – eleito a palavra do ano de 2017 pela Fundación del Español Urgente (Fundéu BBVA) – foi usado em vários dos seus artigos jornalísticos e em livros.
“Não rejeitamos estrangeiros se forem turistas, cantores ou atletas famosos, rejeitamos se forem pobres”, disse em entrevista à BBC.
Na mesma entrevista, Adela Cortina afirmou que criou o termo justamente para “dar visibilidade a essa patologia social que existe no mundo todo”.
A filósofa afirma que “é comum tratar bem quem pode nos fazer favor ou dar algo em troca e abandonar aqueles que não podem nos dar nada disso”.
Para o padre Júlio, “a grande proposta que a Adelia Cortina coloca é sair da hostilidade para a hospitalidade, em relação a imigrantes, migrantes e refugiados. Ela coloca bastante a questão da Europa em relação aos refugiados. Aqui no Brasil a população de rua são refugiados urbanos, porque ninguém os quer. Eles incomodam em todo lugar. Eles são pressionados a viver apenas em campos de refugiados, que nós chamamos de nomes bonitos, como ‘Centros de Acolhida’”.
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g1