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Promotor de passado polêmico tenta causar reviravolta no caso Eldorado

O promotor de Justiça Alexandre Themístocles, do Ministério Público do Rio de Janeiro, está no “olho do furacão” depois de promover às pressas o arquivamento

Promotor de passado polêmico tenta causar reviravolta no caso Eldorado
Promotor de passado polêmico tenta causar reviravolta no caso Eldorado

Redação Publicado em 17/02/2022, às 00h00 - Atualizado em 18/02/2022, às 08h56


Alexandre Themístocles, do MP-RJ, promoveu o arquivamento repentino de inquérito que investiga falsidade ideológica pelo árbitro da disputa empresarial. Documento da polícia desmente versão do promotor

O promotor de Justiça Alexandre Themístocles, do Ministério Público do Rio de Janeiro, está no “olho do furacão” depois de promover às pressas o arquivamento de um inquérito em sua fase inicial. Uma juíza acatou o arquivamento, mas quatro dias depois mandou reabrir a investigação e deixou o caso, declarando-se impedida de julgar. O caso envolve a maior disputa empresarial do país, entre a J&F Investimentos e a Paper Excellence, pelo controle da Eldorado Brasil Celulose S/A.

O inquérito apura se o árbitro Anderson Schreiber teria cometido o crime de falsidade ideológica, ao omitir sua relação com o escritório de advocacia da Paper. Neste caso, o promotor não esperou o andamento natural da investigação e concluiu que não houve crime, opinando pelo arquivamento. Com um histórico de já ter sido acusado de atuar motivado por interesses pessoais, Themístocles pediu no dia 10 o arquivamento do caso citando esclarecimentos de uma testemunha que tinha depoimento marcado apenas para esta sexta-feira (18), a pedido do próprio promotor. O delegado já desmentiu até que tivesse remetido o inquérito para apreciação do MP, como alegou o promotor.

DIZ O PROMOTOR – Em sua manifestação ao Judiciário, o promotor faz entender que a polícia lhe remeteu o inquérito e que ele examinou todas as provas colhidas, mas entendeu que não houve crime. “Antes mesmo do decurso do prazo de 120 (cento e vinte) dias, fixado para o cumprimento das diligências, a autoridade policial da DDEF – Delegacia de Defraudações, em 14/01/2022, encaminhou o inquérito policial à apreciação do Parquet, sem o relatório conclusivo das investigações (artigo 10, § 1º, do Código de Processo Penal) e sem requerimento de devolução para posteriores diligências (art. 10, § 3º). Cuidadosa análise do procedimento investigatório, à luz das diligências já realizadas, permite concluir que a existência do documento eletrônico de Declaração de Aceitação, Disponibilidade, Imparcialidade e Independência do Árbitro da CCI, a identidade do emissor, as declarações nele inseridas, sua juntada em processo arbitral e a participação do árbitro impugnado em sociedade de advogados são fatos incontroversos sobre os quais não recaem necessidade de esclarecimentos complementares. Do mesmo modo, a integridade, a autenticidade e a tempestividade do documento eletrônico também não foram questionadas pela empresa noticiante, nem pelo advogado investigado. Por isso, não há nenhuma outra diligência imprescindível à formação da opinio delict que justifique a devolução do inquérito à autoridade policial (artigo 16 do Código de Processo Penal).”, escreveu Alexandre Themístocles.

O sinal de alerta soou porque o promotor havia sido extremamente favorável à abertura do inquérito, e porque não havia um relatório final da polícia sobre o caso. Mas o estranhamento causado pela postura de Themístocles só aumentou, sobretudo quando se soube que o delegado responsável pela investigação ainda não havia enviado o inquérito ao promotor. Em uma declaração assinada, o a autoridade policial deixa claro que não remeteu o inquérito para análise do promotor.

CONTESTA O DELEGADO – Em certidão oficial, o delegado Alan Luxardo informa que foi feita apenas uma remessa habitual e corriqueira de documentos do inquérito. “Esclareço que no dia 14 de Janeiro de 2022 foi feita a remessa virtual de diversas peças do procedimento. Analisando os trâmites realizados, verifica-se que há um total de quatro remessas documentais, o que não significa a remessa do inquérito com solicitação de prazo para prosseguimento das investigações, até porque, essa remessa não impede a continuação da geração de peças e colheita de termos. No referido dia não houve despacho encaminhando o inquérito policial com solicitação de prazo ou informando o encerramento procedimental com relatório conclusivo.”

O CASO – A disputa entre a Paper e J&F se refere à compra da Eldorado Celulose. Um Tribunal Arbitral chegou a declarar a Paper vitoriosa na disputa, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo suspendeu o efeito da sentença arbitral justamente devido à conduta do árbitro Anderson Schreiber – o investigado no inquérito arquivado por Themístocles.

O comportamento do promotor mostrou uma rápida inversão, em relação ao que ele próprio dizia em outubro ao ano passado.

Themístocles defendeu com fervor a instauração do inquérito e até determinou ao delegado que fizesse diligências. Entre elas, o depoimento do advogado Guilherme Forbes, sócio do escritório Stocche Forbes, que funcionou na sala do árbitro Anderson Schreiber.

Para pedir o arquivamento da investigação, o promotor alegou que “a testemunha Guilherme Forbes esclareceu que não possui nenhum vínculo pessoal ou profissional com o árbitro Anderson Schreiber”.

O problema é que a tal testemunha, o advogado Forbes, ainda não prestou depoimento no inquérito. A declaração a que o promotor se referia havia sido descrita em uma petição dos advogados de Forbes, contrariando diversos outros documentos constantes do inquérito, tais como o contrato de compartilhamento de espaço e despesas entre os escritórios do advogado da Paper e do árbitro que julgou a favor da mesma empresa.

HISTÓRICO – O histórico polêmico do promotor Alexandre Themístocles, no entanto, não começou no caso da Eldorado Celulose. Nos anos 2000, o promotor foi acusado de usar sua função para prejudicar a Federação de Futebol do Rio, por represália.

O promotor e seu pai, ex-diretores do Fluminense, teriam tido diferenças com outros dirigentes que, tempos mais tarde foram a afastados por uma coincidente operação do MP.

Francisco Vasconcelos, pai do promotor, ainda foi acusado de pedir R$ 200 mil de propina para outros cartolas, segundo versões da época, para que o filho, o promotor, se manifestasse favorável a eles.

Em razão da saída da juíza Daniela Prado, que se declarou impedida no caso, o processo será enviado a outro magistrado que poderá determinar novas apurações, inclusive em relação a atuação do promotor de justiça. O Diário não conseguiu contato com o promotor, a juíza e os demais envolvidos. Assim que se manifestarem, a reportagem será atualizada.

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