Eleito em julho com 53% dos votos, Andrés Manuel López Obrador, de 65 anos, toma posse como novo presidente do México neste sábado (1º). Conhecido em seu país
Redação Publicado em 01/12/2018, às 00h00 - Atualizado às 09h23
Eleito em julho com 53% dos votos, Andrés Manuel López Obrador, de 65 anos, toma posse como novo presidente do México neste sábado (1º). Conhecido em seu país pela sigla AMLO, ele quebra uma sequência de nove décadas de governos conservadores e centristas no país ao colocar no poder o partido esquerdista Movimento Regeneração Nacional (Morena).
O mandato de AMLO vai até 2024. No entanto, o novo presidente prometeu convocar um referendo no meio do período para que os eleitores decidam se ele completará ou não os quase seis anos no cargo.
Ao assumir o cargo neste sábado, AMLO venceu as eleições com a promessa de um governo “austero, sem luxos ou privilégios”, de combate firme à corrupção e que preservará o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta, na sigla em inglês), inicialmente ameaçado por Donald Trump e, depois, reformulado em acordo.
Veja os principais desafios de AMLO na presidência
Um dos maiores problemas do México, a violência atinge níveis alarmantes a cada ano. Em 2017, o país registrou 25.339 assassinatos – o mais violento em duas décadas.
E este ano pode ainda ultrapassar essa marca, porque, só no primeiro trimestre, o México teve 7.667 mortes violentas. O dado representa aumento de 20% em relação ao mesmo período em 2017.
A violência manchou também a campanha eleitoral, considerada “a mais violenta” dos últimos anos. Entre setembro de 2017, quando começou a pré-campanha, até julho de 2018, houve 124 políticos assassinados. Desses, 29 eram pré-candidatos e 18, candidatos, segundo balanço da empresa e de veículos locais, citado pela AFP.
A questão da violência no México passa pelos conflitos de mais de uma década entre militares e cartéis de tráfico de drogas – esses, inclusive, lutam entre si. Em grupos menores, traficantes lutam por rotas de tráfico e território para vender os entorpecentes.
Estima-se que mais de 200 mil morreram desde dezembro de 2006, quando o governo lançou a operação militar antidrogas, segundo dados oficiais que não detalham quantos casos estariam ligados ao crime.
A plataforma de AMLO, no entanto, prevê uma posição mais liberal em relação à solução do problema no país. Em outubro, o então presidente eleito reconheceu a legalização de certas drogas como parte de uma estratégia mais ampla de combate à pobreza e ao crime.
Na mira de uma possível legalização, estão a maconha e o ópio. AMLO, inclusive, disse que procuraria pagar mais aos agricultores pelo milho, como forma de dissuadi-los de plantar sementes de papoula – matéria-prima do ópio.
A flexibilização das leis sobre a maconha, na verdade, vem sendo debatida mesmo antes de AMLO vencer as eleições. Em 2015, a Justiça mexicana autorizou a importação de um medicamento derivado da cannabis para o tratamento de uma menor que sofre de epilepsia.
Dois anos mais tarde, o Congresso mexicano aprovou o uso medicinal da maconha. Além disso, em 2018, a Suprema Corte do México decidiu que qualquer cidadão pode solicitar uma permissão ao governo federal poderá consumir recreativamente maconha.
Em política externa, a maior questão a ser enfrentada pelo governo AMLO é, evidentemente, a relação com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Mas apesar dos discursos duros do norte-americano contra imigrantes ilegais mexicanos – a quem chamou de estupradores e traficantes – e da posição política praticamente oposta, a relação entre os dois presidentes começou boa.
O futuro governo de AMLO concordou em apoiar o plano de Trump para mudar a política de fronteira entre os dois países. Pela nova proposta, quem quiser se refugiar nos Estados Unidos terá de esperar no México enquanto o processo segue pelos tribunais norte-americanos.
A questão migratória interessa a AMLO porque, neste ano, o México teve de lidar com caravanas de migrantes de países da América Central. Esse grupo tenta passar, desde outubro, para os Estados Unidos usando a fronteira mexicana.
Nem sempre os migrantes de países como Guatemala, Honduras e El Salvador foram bem recebidos no México. Se na capital o governo instalou um grande campo para acolher a caravana, em Tijuana, cidade fronteiriça, houve protestos de mexicanos contra a presença dos migrantes.
Na travessia em Tijuana, inclusive, autoridades norte-americanas lançaram bombas de gás lacrimogêneo contra os imigrantes que estavam perto da passagem de pedestres. O governo de Enrique Peña Nieto pediu explicações aos EUA pelo incidente e deportou 98 pessoas integrantes da caravana.
Caso AMLO consiga adotar uma postura dura com imigrantes de outros países da América Latina e ainda demova os mexicanos de cruzar a fronteira com os EUA, é possível que o novo presidente mexicano tenha relação ainda melhor com Trump.
No entanto, o muro prometido pelo presidente dos EUA na fronteira com o México pode dificultar a conversa dos dois líderes. Isso porque Trump é a favor não só de se cercar a divisa como obrigar, de alguma forma, o vizinho a pagar pela obra.
Em setembro, AMLO rechaçou a ideia. “Vamos convencê-los de que o problema migratório não se resolve construindo muros, ou com o uso da força, mas é um trabalho diplomático de respeito. Não vamos brigar com o governo dos Estados Unidos. Não vamos brigar com o presidente Donald Trump”, disse.
Outra desafio será a condução da economia. Isso porque há a desconfiança de setores mais conservadores do México quanto à forma com a qual ele vai agir com as finanças de um país que deve crescer 2,2% em 2018, segundo projeção do FMI.
Setores à direita da política mexicana, inclusive, consideram AMLO “populista e chavista”. Candidato derrotado na eleição, Ricardo Anaya, e o Partido Ação Nacional (PAN), acusavam o adversário de querer transformar o México em uma Venezuela.
A equipe econômica de AMLO, então, tenta desfazer essa imagem. Carlos Urzua, escolhido pelo presidente mexicano para comandar o Ministério das Finanças ainda na campanha, disse que se reuniu com mais de 65 fundos de investimento, dizendo a eles que o candidato está comprometido a dar autonomia ao banco central, uma livre flutuação de moeda, livre comércio e manter um controle sobre gastos.
Além disso, a reformulação do Tratado de Livre Comércio da América do Norte (Nafta) – agora Acordo Estados Unidos-México-Canadá (USMCA, na sigla em inglês) – parece ter jogado a favor de AMLO. O novo presidente mexicano enviou um representante às negociações com os vizinhos a favor do acordo. Em outubro, os três países da América do Norte, enfim, assinaram um novo tratado.
Jesus Seade, negociador-chefe para o Nafta de López Obrador, presidente eleito no México, dá entrevista na Cidade do México — Foto: Edgard Garrido/Reuters
A participação mexicana foi importante porque tanto o governo do então presidente Enrique Peña Nieto, em fim de mandato, quanto um representante de AMLO participaram das negociações. E Trump, antes reticente em relação ao bloco e até favorável a retirar o país dele, gostou do acordo.
AMLO, inclusive, advogou a favor da negociação ao escrever uma carta a Trump pedindo, entre outras coisas, a revisão do Nafta. O mexicano pediu ao presidente dos EUA um “esforço por concluir a renegociação” do acordo, a fim de evitar “prolongar a incerteza” econômica.
O México considera a negociação com Trump vital, uma vez que 80% das exportações do país têm como destino os Estados Unidos, seu maior sócio comercial.
Nasceu em 13 de novembro de 1953 em Macuspana, no estado de Tabasco, no sul do país. É casado e pai de quatro filhos.
Formado em ciências políticas e administração pública, é um velho conhecido da política mexicana. Militou nos Partido Revolucionário Institucional (PRI) – que governou o México ininterruptamente de 1929 a 2000 -, Partido da Revolução Democrática (PRD) e na Frente Democrática Nacional, coalizão de esquerda e de dissidentes do PRI.
Foi prefeito da Cidade do México de 2000 até 31 de julho de 2005, quando renunciou para começar a campanha presidencial nas eleições de julho de 2006. AMLO concorreu pela Aliança pelo Bem de Todos (integrada por PRD, PT e Convergência).
O presidente eleito do México, Andrés Manuel López Obrador, durante evento de agradecimento a eleitores em Acapulco, no dia 3 de outubro — Foto: Reuters/Javier Verdin/File Photo
Perdeu por uma margem muito pequena, menor do que um ponto percentual, para Felipe Calderón, ligado ao Partido da Ação Nacional (PAN). À época, AMLO, que durante a campanha era apontado como favorito, denunciou fraude eleitoral e manipulação de resultados.
Aquela foi considerada a eleição mais controversa do país. Durante semanas, manifestantes mexicanos acamparam no centro da capital, bloquearam bancos, impediram a cobrança de pedágios nas estradas, paralisaram o tráfego na Cidade do México e enfrentaram a tropa de choque da polícia. Os protestos diminuíram até acabar, depois que Justiça Eleitoral rejeitou as impugnações apresentadas por López Obrador e declarou a vitória a Calderón.
AMLO voltou a concorrer à presidência nas eleições de 2012, pela coalizão Movimento Progressista. Perdeu para Enrique Peña Nieto, do PRI, que trazia uma imagem moderna ao partido que governou o país durante 71 anos e era criticado por um passado autoritário e corrupto. Peña Nieto foi eleito com 38,2% dos votos, enquanto Obrador ficou com 31,6%.
Em 2014, fundou o Movimento Regeneração Nacional (Morena), um dos partidos mais jovens do México. Nas eleições desse ano, o Morena se juntou com os Partido do Trabalho (PT) e o Partido Encontro Social (PES) para formar a aliança Juntos Faremos História, que promoveu a candidatura de Obrador.
AMLO chama seu movimento de “a quarta transformação do México” e se compara a heróis nacionais como Benito Juárez (1806-1876), figura-chave na construção da República no século XIX.
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