Na última semana, diversos fatos geraram debates confrontadores na imprensa e nas redes sociais sobre a desigualdade racial e o racismo no Brasil.
Redação Publicado em 04/10/2020, às 00h00 - Atualizado às 14h56
Na última semana, diversos fatos geraram debates confrontadores na imprensa e nas redes sociais sobre a desigualdade racial e o racismo no Brasil.
Casos como o da juíza acusada de racismo ter sido absolvida , o da jornalista Glória Maria ter dito que “tudo é racismo” e o das lojas de eletrodomésticos Magazine Luiza e da farmacêutica Bayern terem sido acusadas desde racistas a propagadoras da diversidade , por promover um processo seletivo de trainee exclusivo para candidatos negros, são apenas alguns exemplos de como o debate sobre raça tem pautado a agenda pública neste ano.
O iG ouviu especialistas dedicados ao tema para compreender o que está por trás dos debates mais recentes sobre raça e racismo no Brasil, bem como a profundidade do tema.
O professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e pós-doc pelo The Hutchins Center for African American Research de Harvard, Matheus Gato, de 36 anos, avalia que a conjuntura política do governo conservador do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) estimula a reação do movimento negro.
“O campo progressista que politiza o racismo tem mais voz pública do que antes”, argumenta. “Estamos em um período em que ao mesmo tempo em que a sociedade tem noção do racismo estrutural — fenômeno de desnaturalização do racismo — a gente tem setores da sociedade investindo nas formas mais abertas de racismo e discriminação . Cai a ideia de que o racismo é velado”, diz.
Nesse sentido, a historiadora e professora do Instituto Federal de São Paulo (IFSP), Juliana Serzedello, relembra o caso recente promovido pelo governo federal, por meio da Fundação Palmares , chefiada por Sérgio Camargo, de retirar o nome da deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) da lista de personalidades negras da fundação.
“Em um governo de extrema direita , como o que a gente está vivendo agora, o debate público tende a inflamar temas que são espinhosos para este governo. Em um governo que acolhe as pautas raciais e promove políticas públicas de igualdade racial, o tema tende a ficar mais bem acomodado nas relações sociais”, diz Serzedello.
“Este governo não só não pretende acomodar a pauta racial, como ele pretende tensionar este campo. Ele pretende criar situações de tensão racial”, complementa.
A proposta de um programa de trainee organizado pela empresa Magazine Luiza, como forma de reconhecer a ausência de lideranças negras na empresa e a necessidade de diversificar os quadros, fez com que uma das maiores lojas de eletrodosméticos do país se tornasse o assunto mais comentado do Twitter Brasil, com a hastag ” Magazine Luiza racista “.
Políticos de direita impulsionaram o debate contra a iniciativa, enquanto intelectuais negros, lideranças do movimento negro e políticos ligados ao campo da esquerda comentaram a importância da iniciativa. A Juliana Serzedello destaca que a existência de um debate mais intenso sobre o racismo não o torna maduro e qualificado.
“Eu não sei se o debate amadureceu ou se ele só se tornou acessível a mais pessoas, porque o debate sobre as questões raciais no Brasil é maduro há muito tempo. Desde a discussão sobre como seria feita a abolição nós podemos dizer que há um movimento negro debatendo o assunto. O movimento negro é muito consistente há muito tempo, mas o que aconteceu é que mais pessoas ficaram sabendo que ele existe”, diz a historiadora.
“O fato do problema das questões raciais estar chegando para mais pessoas não quer dizer que está chegando com qualidade de informação. Principalmente se a gente pensar que as pessoas estão se informando em grupos que estão produzindo contra-informações. É complicado dizer que se o fato das pessoas estarem acessando mais informação faz com que elas saibam melhor das coisas”, complementa.
Para Gato, a presença de negros no debate sobre raça revela uma nova e importante perspectiva sobre o tema, que mesmo atingindo diretamente a população negra, por diversas vezes é debatido por intelectuais brancos, como no caso da discussão sobre a aprovação da lei de cotas, relembra.
“A questão não é se o debate sobre racismo amadureceu, porque essas coisas não são feitas necessariamente com consciência. Esse é um campo de luta, mas hoje você tem pessoas ligadas ao tema posicionadas em lugares para pressionar isso”, diz.
Debates como o da Magazine Luiza tendem a mostrar a face estrutural do racismo, porém casos de racismo mais explicítos, como o da juíza do Paraná que condenou e agravou a pena de um garoto negro por conta das suas características física s, tendem a ser individualizados e repercutidos com mais frequência na imprensa. Muitas vezes gerando a sensação de uma onda crescente de casos de racismo.
“É díficil quantificar a violência racial, porque ela pode estar no número de assassinatos de homens negros por arma de fogo, ou no acesso de pessoas negras a universidade. Ela pode estar nesses dados mais macro ou em questões micro, como uma pessoa ser impedida de entrar numa agência bancária. É difícil quantificar a experiência do racismo porque ela é múltipla”, análisa Serzedello.
O Matheus Gato alerta para algumas faces da onda de notícias sobre casos de racismo, dentre elas a mudança da imprensa brasileira após o caso George Floyd, que passou a repercutir e analisar com mais responsabilidade os casos de racismo locais.
“A publicização ajuda as pessoas a terem coragem para denúncia, independente do contexto. Os movimentos sociais sempre alertaram para isso. Mas o governo se apresenta com essa face de silenciar e lidar de maneira folclórica com a questão do racismo, por isso mobilizar esse tema é importante para as pessoas que vão contra este governo. Neste contexto o debate é favorecido, mobilizar o tema é de alguma forma armar a população contra o racismo”, análisa.
Em entrevista à jornalista Joyce Pascowich no último dia 25 de setembro, Glória Maria se posicionou contra o chamado “politicamente correto”e disse que ” hoje tudo é racismo, preconceito e assédio “. Novamente, a imprensa e as redes sociais foram tomadas pela discussão.
Dessa vez, o grande fator de comoção foi o fato de uma personalidade negra não ter se mostrada completamente alinhada à agenda de combate ao racismo promovida pelos movimentos negros.
Os especialistas Matheus Gato e Juliana Serzedello não individualizam as falas de Glória Maria, mas ressaltam um fator importante neste evento que é a possibilidade de desmistificar a ideia “racista” de unidade do povo negro.
“O racista espera que os negros sejam uma coisa só , que todos tenham as mesmas posições. Você tem brancos de direita e de esquerda e isso não é um problema para a questão racial, mas você ter negros na direita é um problema de identidade. Tem que veja como uma contradição ser negro e ser de direita”, diz Gato.
“Episódios como esse deixam claro que não é porque as pessoas são negras que elas têm que pensar igual”, complementa Serzedello.
O sociológo Gato propõe ainda uma outra reflexão sobre o processo de formação de personalidades como a Glória Maria e a inserção de pessoas negros em contextos majoritariamente brancos.
“As estratégias dessas pessoas nesse mundo branco, como diz o Florestan Fernandes, é o silenciamento, é não tornar a relação com o preconceito racial uma questão política. É necessário entender o lugar do qual ela está falando”, diz.
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IG
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