Marcus Vinicius de Freitas: Trump e a eleição de 2020

As eleições norte-americanas de 2020 são, certamente, uma das mais interessantes da História recente daquele país, dividido politicamente já há pelo menos

Marcus Vinicius de Freitas: Trump e a eleição de 2020 -

Redação Publicado em 05/08/2020, às 00h00 - Atualizado às 11h26

Trump e a eleição de 2020

As eleições norte-americanas de 2020 são, certamente, uma das mais interessantes da História recente daquele país, dividido politicamente já há pelo menos duas décadas e que enfrenta uma de suas situações mais difíceis desde a Segunda Guerra Mundial. Os três grandes desafios atuais dos Estados Unidos são: crescimento econômico, o elevado desemprego e o desafio da retomada da liderança global. Os dois candidatos para assumir estes desafios são Donald John Trump e Joseph Robinette Biden Jr., ambos septuagenários, que, apesar da legitimidade do voto que receberão, estão aquém de representar a enorme diversidade que constitui, atualmente, os Estados Unidos da América.

Trump, apesar do desgaste de um processo de impeachment em que foi absolvido, chega às eleições na expectativa de que o eleitor lhe dê um voto de confiança, no sentido de ser o único capaz de recuperar a economia norte-americana pós-Covid19, baseado nos resultados positivos acumulados nos três anos anteriores, além de responsabilizar a China por todos os problemas econômicos existentes, numa tentativa de instaurar uma nova Guerra Fria. Biden, por sua vez, utiliza à la carte as realizações do governo Barack Obama, quando lhe são convenientes, para contrapor-se às políticas de Trump, com um olhar mais voltado às questões sociais, imigração e de maior apelo às minorias. O conteúdo de ambos, em alguns assuntos, não será tão diferente, mas o estilo, certamente, sim.

Erra, no entanto, quem descarta a viabilidade de Trump, afinal ele cumpriu muito do que prometeu.  No plano internacional, por exemplo, a imigração ilegal advinda do México diminuiu, mesmo sem o tão propagado muro, o Estado Islâmico foi reduzido substancialmente em tamanho, Bashar Assad foi rapidamente punido por haver usado armas químicas e Jerusalém foi reafirmada como capital eterna do Estado de Israel, além da mudança em políticas tradicionais que não vinham apresentando resultados efetivos. Até mesmo Kim Jong-Un retrocedeu diante da imprevisibilidade de Trump, que jamais pretendeu ser um líder global..

Na agenda doméstica, Trump restaurou muitos assuntos caros à pauta conservadora: colocou na Suprema Corte dois juizes conservadores, manteve sua posição pró-vida e enfatizou a necessidade de uma reforma imigratória ampla, tema da agenda de todos os presidentes nos últimos 30 anos, mas que não conseguiram caminhar muito por falta de coragem política. Reconheceu, ainda, o enorme problema dos opióides, um dos grandes desafios de uma sociedade rica e dependente de drogas, ainda que medicinais e passou a combatê-los.

Por outro lado, Biden conta com um elevado nível de cansaço de Trump e sua onipresença desgastada na mídia. Além disso, Biden, político experiente há decadas, foi um fiel escudeiro de Barack Obama, um dos presidentes mais queridos pelos Democratas, e conseguiu vencer, de modo impressionante, uma disputa partidária acirrada, revertendo uma tendência negativa, com grande apoio da minoria afro-descendente. Para contrabalancear a falta de diversidade nas candidaturas, Biden prometeu selecionar uma mulher como sua companheira de chapa, que poderia, inclusive, ser uma afro-descendente. Biden pretende retomar alguns aspectos abandonados por Trump, como mudança climática, Obamacare e também a questão dos migrantes.

Mais do que a questão tradicional feita no momento do voto quanto à situação atual do país quando comparada há 4 anos, desta vez o eleitor se perguntará se, daqui a 4 anos, estará menos pior do que atualmente. É uma eleição mais baseada numa perspectiva futura do que a presente.

A eleição nos Estados Unidos é um misto de voto popular e seletivo, que é o do Colégio Eleitoral. A ideia por trás do Colégio Eleitoral é a de que não haja uma prevalência dos estados mais populosos na decisão final sobre a presidência da república, criando-se um mecanismo de freios e contrapesos no processo. O número mágico é 270.

Trump conseguiu vencer no Colégio Eleitoral em 2016. Sem os benefícios do acordo comercial com a China e com os resultados negativos da economia em 2020, sua situação complicou nos estados que o apoiaram no passado. Muitos são contrários ao estilo e agenda de Trump. Resta saber se ele conseguirá convencer que terá a capacidade de assegurar a recuperação econômica do seu país e a sua manutenção como principal economia global. Perder essa posição terá enorme impacto em sua posição hegemônica. Eis a grande oportunidade de JoeBiden!

Marcus Vinicius de Freitas, Professor de Direito e Relações Internacionais, na Universidade de Relações Exteriores da China
Twitter/Instagram: @mvfreitasbr

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