Tragédia

Justiça do RS decide novo destino dos 4 condenados pelo incêndio na boate Kiss

A mudança foi estabelecida pela 1ª Câmara Criminal, em Porto Alegre

Cartaz com fotos de vítimas do incêndio da Boate Kiss na fachada do Tribunal de Justiça em Porto Alegre (RS) - Imagem: Reprodução/RBS TV

Mateus Omena Publicado em 04/08/2022, às 11h41

O TJ-RS (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul) decidiu, na tarde de quarta-feira (3), anular o julgamento dos quatro condenados pelo incêndio na Boate Kiss, que matou 242 pessoas e deixou outras 636 feridas em 2013.

A decisão foi tomada pela 1ª Câmara Criminal, em Porto Alegre. Foram dois votos a favor da anulação e um contrário. Com a decisão, da qual cabe recurso, um novo júri deve ser marcado.

Em dezembro de 2021, os quatro haviam sido condenados pelo Tribunal do Júri em um julgamento que durou dez dias. Agora, todos serão soltos.

No entanto, o Ministério Público (MP) criticou a anulação e declarou que vai recorrer.

"Através de recursos, tanto ao STJ, como ao STF, nós buscaremos a reversão dessa decisão e do reestabelecimento da justiça", afirmou Júlio César de Melo, subprocurador-geral de Justiça para assuntos institucionais do MP-RS.

Depois da condenação, a defesa dos quatro condenados fez apelações na Justiça, alegando que havia nulidades no processo e no julgamento. Um dos pontos questionados pelos advogados foi a sentença por dolo eventual, ou seja, quando, mesmo sem desejar o resultado, se assume o risco de matar.

Na época do julgamento, foram sentenciados por dolo eventual os dois sócios da boate - Elissandro Callegaro Spohr, conhecido por Kiko, e Mauro Londero Hoffmann - e dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira - o produtor Luciano Bonilha Leão e o vocalista, Marcelo de Jesus dos Santos.

Recentemente, o advogado de Spohr, Jader Marques, explicou que a sentença por dolo eventual "deveria anular o julgamento". Por outro lado, o advogado Jean Severo, que defende Luciano Bonilha, observou que até "um acadêmico" ou um estudante "que cabula aula" saberia que a sentença não poderia ser por dolo eventual.

Os advogados também solicitaram a anulação do julgamento devido a escolha dos jurados, selecionados após três sorteios, por manifestações da plateia durante o julgamento e pela conduta do juiz Orlando Faccini Neto, considerada por eles como "parcial".

Contraponto

Para o desembargador Manuel José Martinez Lucas, relator dos recursos e presidente da sessão, os 19 pedidos de nulidade apresentados pelos advogados dos réus não poderiam ser considerados.

O magistrado explicou que, mesmo que alguns pontos pudessem resultar na nulidade do julgamento, é preciso que o processo tenha um fim. "As famílias esperam uma resposta e os próprios réus", disse.

O desembargador destacou o risco de outros júris serem anulados, caso se decidisse fazer o mesmo no da Boate Kiss.

Em contrapartida, o desembargador José Conrado Kurtz de Souza se manifestou favorável a algumas nulidades, como a crítica ao sorteio dos jurados e de uma conversa em privado do magistrado com as defesas - sem a presença do Ministério Público. Mas, em outros pontos, ele acompanhou o relator.

Por último, o desembargador Jayme Weingartner Neto votou pela anulação do Tribunal do Júri e realização de um novo julgamento. Uma das justificativas está relacionada à "paridade de armas", que é a igualdade no tratamento das partes do processo. O magistrado indicou que houve desequilíbrio na atuação do Ministério Público em relação aos advogados de defesa.

Weingartner Neto também observou que regras foram descumpridas na escolha dos jurados e que os "atos praticados foram atípicos".

"Foram descumpridas no sorteio de número excessivo de jurados, e foram descumpridas na realização de três sorteios, sendo o último flagrantemente fora do prazo legal (24/11/2021), a menos de dez dias úteis da data da instalação da sessão (1º/12/2021)", disse.

Antes dele, Conrado já havia salientado que a lei não tinha sido seguida neste quesito. "É preciso zelar para que todos julgamentos, complexos ou não, obedeçam à lei. Não há dois Códigos de Processo Penal. O sorteio de 25 jurados é o ponto fulcral da questão", disse.

Condenação

Em dezembro de 2021, as penas foram lidas pelo juiz Orlando Faccini Neto, que considerou "elevada a culpabilidade dos réus".

Como as penas foram definidas:

Elissandro Spohr - 22 anos e seis meses de prisão
Mauro Hoffmann - 19 anos e seis meses de prisão
Luciano Bonilha - 18 anos de prisão
Marcelo de Jesus - 18 anos de prisão

O julgamento ocorreu em Porto Alegre, a 289 km de distância de Santa Maria, onde ocorreu a tragédia.

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