8 em cada dez vítimas de violência contra mulher sofreram abusos psicológicos na pandemia, diz projeto que atua com rede de voluntárias

Oito em cada dez vítimas de violência contra mulher sofreram abusos psicológicos durante a pandemia da Covid-19, segundo um levantamento feito pelo projeto

8 em cada dez vítimas de violência contra mulher sofreram abusos psicológicos na pandemia, diz projeto que atua com rede de voluntárias -

Redação Publicado em 31/03/2022, às 00h00 - Atualizado às 08h01

Oito em cada dez vítimas de violência contra mulher sofreram abusos psicológicos durante a pandemia da Covid-19, segundo um levantamento feito pelo projeto ‘Justiceiras’, com base nos 9,5 mil atendimentos feitos desde março de 2020.

O projeto foi criado há dois anos para apoiar mulheres em situação de risco e atua com rede de 10 mil voluntárias no Brasil e no exterior (abaixo os detalhes do levantamento divulgado nesta quinta-feira (31), no mês em que é celebrado o Dia Internacional da Mulher).

Do total de atendimentos realizados pelo ‘Justiceiras’ entre março de 2020 e março de 2022, 3.934 mulheres em situação de risco (45,1% dos atendimentos) fizeram seu primeiro pedido de socorro ao Justiceiras. Ou seja, não procuraram outras instituições oficiais que poderiam fazer a acolhida das vítimas, como Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), Delegacias de Defesa da Mulher (DDMs) e Polícia Militar.

As mulheres relataram diferentes tipos de violência, como violência psicológica (82,96%), física (59,06%), sexual (52,48%) e patrimonial (68,59%), na maioria das vezes, dentro da própria casa (74,89%). Em cada dez mulheres, sete relataram situações de média e alta gravidade cometidas por seus atuais relacionamentos (40,41%) ou anteriores (37,86%). Outra preocupação é o acesso dos agressores a armas: quase um quarto das vítimas confirmou essa situação às voluntárias

Os dados demonstram ainda que, apesar da violência de gênero estar em todas as classes, a maior parte das mulheres atendidas tem baixa renda.

Cerca de 70% recebem até um salário mínimo, sendo que 2.773 do total não tinham renda alguma e 3.603 delas estavam desempregadas. Metade tem filhos e se considera preta, parda ou indígena.

Para Gabriela Manssur, promotora de Justiça do Ministério Público de São Paulo, a rede de apoio formada pelas voluntárias funciona como a melhor amiga da mulher vítima de violência, oferecendo atendimento jurídico, psicológico, socioassistencial e acolhimento.

‘Antes eu era uma pessoa diminuída, hoje me sinto forte’

“Há muito tempo eu vivi um relacionamento abusivo, que envolvia violência patrimonial, psicológica e moral. Definitivamente eu precisava sair dessa situação. Eu, como psicóloga, já entendia isso, mas eu precisava de recursos jurídicos”. Foi por essa razão que a psicóloga Ana Bittencourt procurou o projeto em abril de 2020. Depois de falar com alguns advogados, ela não se sentia segura nem acolhida para conseguir se separar do ex-marido.

“Eu consegui, com mulheres me escutando, compreender o que eu poderia, o que eu deveria e o que eu teria de direitos nessa relação abusiva. Eu cheguei a procurar advogados, mas alguns até tentaram me demover da ideia de separação. Eu encontrei no projeto acolhimento. Diante dessas informações que as voluntárias me passaram, eu consegui reunir forças pra sair desse relacionamento abusivo”, conta.

Em setembro do mesmo ano, ela assinou o divórcio.

“Eu era uma pessoa pequena, diminuída. Hoje eu sou uma pessoa grande. Eu me sinto forte, dona dos meus diretos, dona da minha vida. Eu consigo olhar pro futuro, vendo que tudo o que eu passei foi um aprendizado e estender as mãos pra outras pessoas que precisam de ajuda”.

Ana Bittencourt decidiu virar voluntária do projeto e ressalta que o Brasil carece de políticas públicas e da sensibilidade da sociedade para a violência contra a mulher, principalmente a psicológica.

“Eu costumo dizer que a violência psicológica é a pior das violências, porque ela é a porta de entrada para todas as outras. Você é colocada numa situação em que você é tão diminuída que você começa a duvidar da sua própria capacidade de ação. Eu escutava coisas como: ‘se você separar de mim, você vai passar fome. Se você se separar de mim, ninguém vai te respeitar ou te querer. Então tudo isso acaba minando o poder pessoal de cada mulher, e fica difícil a gente reconhecer o que está acontecendo”, revela.

Em julho de 2021, uma lei sancionada pelo governo federal tornou crime a violência psicológica, mas muitos casos ainda são subnotificados porque as vítimas não sabem que têm esse recurso ou por medo de denunciar.

A violência psicológica pode não ser vista como crime porque muitas vítimas entendem que por não deixar marcas físicas o agressor não poderia ser punido criminalmente. Mas as consequências da violência psicológica podem ser profundas na saúde de quem sofre, como ansiedade, depressão, e ser o início de um ciclo abusivo que pode se intensificar e se transformar também em agressões físicas ou até mesmo um feminicídio.

Vítimas de violência contra a mulher

(Fonte: Projeto Justiceiras)

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