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Um mês após morte da cicloativista Marina Harkot, Prefeitura de SP reforma ciclovia de avenida onde ela foi atropelada

Cicloativistas homenagearam Marina Harkot com foto e cartazes em alusão a ela na Avenida Paulo VI — Foto: Rodrigo Rodrigues/G1

Marinha Harkot
Marinha Harkot

Redação Publicado em 08/12/2020, às 00h00 - Atualizado às 17h01


Cicloativista pedalava junto ao meio-fio da Avenida Paulo VI, quando foi atingida por um carro SUV e foi deixada no local pelo motorista.

Cicloativistas homenagearam Marina Harkot com foto e cartazes em alusão a ela na Avenida Paulo VI — Foto: Rodrigo Rodrigues/G1

Cicloativistas homenagearam Marina Harkot com foto e cartazes em alusão a ela na Avenida Paulo VI — Foto: Rodrigo Rodrigues/G1

A Prefeitura de São Paulo começou na segunda-feira (7) a reforma da ciclovia da Avenida Paulo VI, no Sumaré, Zona Oeste da capital, um mês depois que Marina Harkot foi atropelada e morta aos 28 anos naquela via.

A ciclista pedalava na faixa da Avenida Paulo VI junto ao meio-fio por volta da meia-noite do dia 8 de novembro, quando foi atingida por um carro SUV e foi deixada no local pelo motorista, que fugiu sem prestar socorro.

Segundo amigos e familiares, Marina Harkot utilizava a bicicleta como principal meio de transporte, era cicloativista e pesquisadora de mobilidade urbana. A urbanista Paula Freire Santoro, que foi orientadora da tese de mestrado de Marina na USP, informou em entrevistas que a jovem evitava pedalar em áreas escuras e sem movimento, mesmo que precisasse circular nas faixas de rolamento, como na noite em que foi atropelada por trás na Avenida Paulo VI.

Além disso, Marina defendia justamente que os espaços públicos deveriam ser compartilhados, e fez pesquisas sobre o uso das bicicletas pelas mulheres, identificando os trechos em que elas se sentem mais seguras para pedalar na cidade.

Nesta terça-feira (8), a reportagem identificou que foi iniciado na segunda-feira (7) um serviço de reforma da ciclovia nas imediações do acidente e também em parte da ciclovias da Avenida Sumaré e viaduto Antártica, que são continuação da Avenida Paulo VI.

Ciclovia da Avenida Paulo VI é reformada, na Zona Oeste da cidade de São Paulo, nesta terça, um mês após o atropelamento e morte da cicloativista Marina Harkot na avenida — Foto: Rodrigo Rodrigues/G1

Ciclovia da Avenida Paulo VI é reformada, na Zona Oeste da cidade de São Paulo, nesta terça, um mês após o atropelamento e morte da cicloativista Marina Harkot na avenida — Foto: Rodrigo Rodrigues/G1

G1 perguntou à Prefeitura de São Paulo qual o objetivo do serviço e se ele é uma providência para melhorar a estrutura da área em decorrência do acidente com Marina.

Em nota, a Prefeitura não citou o acidente, mas explicou que se trata de uma obra de requalificação dos 3,2 km da ciclovia, seguindo a execução do Plano Cicloviário da cidade. A melhoria consiste no reparo do piso e na implantação do novo padrão de sinalização. A previsão é que as obras estejam concluídas até o fim de dezembro.

Requalificação da ciclovia da Avenida Paulo VI começou na altura da estação Sumaré do Metrô  — Foto: Rodrigo Rodrigues/G1

Requalificação da ciclovia da Avenida Paulo VI começou na altura da estação Sumaré do Metrô — Foto: Rodrigo Rodrigues/G1

Repercussão do acidente

Após ser atingida, Marina Harkot chegou a ser socorrida por uma equipe do SAMU, acionada por uma policial militar de folga que presenciou o acidente, mas não resistiu aos ferimentos e morreu no local.

De acordo com a PM Mariana de Morais Braga, a ciclista estava sem capacete e sem roupa refletiva, mas a via é bem iluminada, de modo que o motorista, “poderia, com certeza, vê-la”.

Por causa do atropelamento, protestos foram realizados local por outros cicloativistas da cidade. O primeiro deles no próprio dia do grave acidente, na Praça do Ciclista, que pediu justiça e um trânsito mais seguro para ciclistas e pedestres.

Frases são escritas nas Avenida Sumaré e Paulo VI, na Zona Oeste de SP, em homenagem à cicloativista Marina Kohler Harkot — Foto: Rodrigo Rodrigues/G1 SP

Frases são escritas nas Avenida Sumaré e Paulo VI, na Zona Oeste de SP, em homenagem à cicloativista Marina Kohler Harkot — Foto: Rodrigo Rodrigues/G1 SP

“Marina é minha filha primeira. Muito amada, muito determinada, muito idealista. E a gente está totalmente despedaçado. Estava construindo uma casa com o marido, um amor, uma vida futura. Estudando, fazendo doutorado, engajada. Obrigada por vocês estarem aqui. E a luta continua. De verdade, estamos juntos, gente. De verdade, muito obrigada”, disse a mãe de Marina, Maria Claudia Mibielli Kohler, no dia do acidente, durante o velório em SP.

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No dia seguinte, as avenidas Paulo VI e Sumaré amanheceram com palavras e frases em memória da cicloativista escritas no asfalto, como “Marina presente” e “Paz”.

“A Marina é vítima tanto do valor ínfimo que a vida tem no Brasil, quanto do sistema que é voltado para o carro”, afirmou Felipe Burato, marido da cicloativista.

Investigação

O caso foi inicialmente registrado como homicídio culposo (quando não há intenção de matar) e fuga do local do acidente no 14° Distrito Policial, em Pinheiros.

No mesmo dia, a Policia Civil identificou o motorista, José Maria da Costa Júnior, de 34 anos, através da placa, anotada por um motociclista, que presenciou a colisão e a fuga, e o seguiu. Com essas primeiras informações, a polícia refez o percurso do homem naquela noite, encontrando o carro em um estacionamento com o vidro da frente quebrado pelo impacto do acidente.

José Maria da Costa Júnior, suspeito de dirigir o carro que atropelou e matou ciclista Marina Harkot em São Paulo — Foto: Reprodução

José Maria da Costa Júnior, suspeito de dirigir o carro que atropelou e matou ciclista Marina Harkot em São Paulo — Foto: Reprodução

Funcionários do estacionamento disseram à polícia que o homem chegou naquela noite com sinais aparentes de embriaguez e uma garrafa de vinho dentro do carro, e indicaram o local onde ele morava, que estava abandonado e com uma porção de maconha.

Os investigadores também tiveram acesso à câmera de segurança de um elevador do prédio, com imagens gravadas momentos depois do acidente. No vídeo é possível ver o semblante calmo e sorridente de Costa Júnior, que conversa com uma moça, carrega a bolsa dela no ombro e fala ao celular.

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A polícia encontrou ainda vídeos, que mostram o momento em que José Maria chega acompanhado no estacionamento, logo após o acidente. É possível ver o para-brisa do veículo estilhaçado por conta do impacto do momento que atingiu Marina.

Sem localizar o motorista, a Polícia Civil pediu a prisão do homem dois dias depois do acidente, no dia 10 de novembro. A Justiça de São Paulo, àquela altura, negou o pedido por “falta de requisitos”, como a acusação de um crime doloso (quando há intenção de matar), a reincidência do suspeito ou, ainda, que se tratasse de caso de violência doméstica e familiar, que justificasse uma medida protetiva.

Naquele mesmo dia, José Maria se apresentou ao 14º Distrito Policial de Pinheiros. Ele chegou à delegacia acompanhado pelo advogado, ficou calado durante o tempo de depoimento e, em seguida, foi liberado. A defesa alegou que o homem fugiu “porque se apavorou” e afirmou que ele nega que estivesse alcoolizado ou em alta velocidade.

José Maria da Costa Júnior falou ao Fantástico e justificou que não parou porque achou que o impacto no carro fosse algo relacionado a um assalto. “Eu tinha que preservar pela minha vida. Eu estava num ambiente em que eu não sabia o que estava acontecendo ao certo. Como tinha mais gente lá, imaginei que tinha gente em condições de poder socorrer eu entreguei para essas pessoas pudessem socorrer essa pessoa, quem tivesse por ali ajudasse ela.”, afirmou.

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Porém, dias depois a Polícia Civil concluiu por um terceiro crime de trânsito: beber e depois dirigir. Apesar do limite de velocidade no trecho da Avenida Paulo VI ser de 50 km/h, uma câmera da CET registrou que o carro passou a 93 km/h. Além disso, os investigadores localizaram a comanda do bar de onde o homem tinha saído, que indicava consumo de uísque, e a amiga do motorista, a estudante Isabela Serafim, de 21 anos, foi localizada, prestou depoimento, e confirmou o consumo de álcool.

O inquérito policial do caso foi concluído e relatado à Justiça no dia 24. José Maria foi indiciado por homicídio culposo (sem intenção de matar), fuga do local do acidente sem prestar socorro à vítima e por ter dirigido sob efeito de álcool. Os amigos que estavam com ele também foram indiciados por omissão de socorro. Todos respondem aos crimes em liberdade.

Em seguida, o Ministério Público de São Paulo pediu para que a Justiça responsabilizasse o motorista por homicídio doloso, pois, para os promotores, o motorista assumiu o risco de matar ao ingerir bebida alcoólica e dirigir em alta velocidade.

No dia 26, a Justiça de São Paulo aceitou o pedido do Ministério Público e reclassificou o inquérito como homicídio doloso. Desse modo, o inquérito foi encaminhado para a Vara do Júri, onde são julgados os crimes dolosos contra a vida. Lá, os promotores vão decidir se denunciam ou não o caso como homicídio por dolo eventual à Justiça.

Caso haja denúncia e a Justiça aceite, o motorista e até os amigos dele se tornarão réus e poderão, se a Justiça concordar, ser julgados por um júri popular. Não há prazo para que o Ministério Público decida se denuncia ou não o motorista e os amigos dele.

Marina Harkot na infância, com sua primeira bicicleta. — Foto: Reprodução/TV Globo

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Gazeta Esportiva.

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