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Skatista cego sonha em competir nas Paralimpíadas

Com os olhos vendados, o instrutor de skate Léo Scott se dedica a algumas manobras. Apesar da longa experiência, Léo sente que o desafio é grande, já que o

SKATISTA
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Redação Publicado em 26/08/2021, às 00h00 - Atualizado às 09h08


Com os olhos vendados, o instrutor de skate Léo Scott se dedica a algumas manobras. Apesar da longa experiência, Léo sente que o desafio é grande, já que o esporte em si conta com referências visuais: saber onde se encontram o corrimão e a rampa, sem falar dos ajustes que precisam ser feitos para que o pé fique corretamente sobre a prancha. É esse desafio que seu aluno, Fernando Araujo, precisa assimilar para viver seu sonho. O skatista de 27 anos possui apenas 20% de visão em um dos olhos e anda pelas pistas da Barra da Tijuca e Jacarepaguá, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Para se comunicar melhor com o instrutor, Fernando sugeriu essa metodologia.

Fernando pratica o skate adaptado, que inclui atletas amputados, com prótese e deficientes físicos e visuais. A modalidade está presente na X-Games, evento referência do esporte, mas ainda não chegou às Paralimpíadas. Por outro lado, o ensino também não é simples. O instrutor conheceu o trabalho do Fernando pela Internet e de cara ficou impressionado, por isso quis ser seu treinador.

– Ainda não existem métodos de ensino para o skate adaptado. Eu acabou aprendendo com o Fernando. Ele me fez entender que o que eu falo parece ser fácil, mas não é bem assim. Quando eu boto a venda, consigo entender a dificuldade dele, que é enorme. Ajusto várias coisas após usar a venda – revela o instrutor de skate.

Cego de nascença, a história de Fernando com o skate começou ainda criança, aos 5 anos, com um presente que ele não recorda bem se ganhou do pai ou do irmão. Seu fascínio pelo esporte surgiu com o videogame, a partir do jogo de Tony Hawk, que fazia sucesso no Nintendo 64. Na época, tudo não passava de uma brincadeira. Ele lembra que era comum ouvir de amigos, também deficientes visuais, que o skate não daria certo. Mas deu. Após 17 anos parado, Fernando, convidado por um amigo deficiente visual, resolveu voltar às pistas com o skate que tinha em casa. E, desde então, não parou de viver seu sonho.

– O que eu tô fazendo no skate já é um sonho realizado. Dar um drope já é estar realizado. E eu vejo o skate adaptado nas Paralimpíadas. Eu também me vejo lá – imagina o skatista.

O skatista ouviu comentários bastante negativos quando decidiu praticar o esporte — Foto: Léo Scott

O skatista ouviu comentários bastante negativos quando decidiu praticar o esporte — Foto: Léo Scott

Antes das aventuras sobre rodas, Fernando praticava Judô. Era faixa marrom. Foram 17 anos vivenciando esse outro de esporte, que começou quando ele era um pequeno estudante do Instituto Benjamin Constant, tradicional centro de ensino para deficientes visuais localizado no Rio. Fernando largou as lutas para se dedicar exclusivamente ao skate.

Praticante do skate park, que entrou nas Olimpíadas 2020, ele frequenta as pistas cariocas da Praça do Ó, na Barra da Tijuca, e do Condomínio Ilha Pura, em Jacarepaguá, para realizar seus treinos. Ele treina com Léo pelo menos uma vez por semana e outras três vezes por conta própria, sendo que cada sessão dura, no mínimo, 4h. Segundo o skatista, esse é o padrão de quem costuma competir nas Olimpíadas. Além disso, ele também pratica exercícios para melhorar a resistência e o equilíbrio duas vezes na semana.

Para aprender as manobras, o skatista passa por alguns desafios. Ele explica que até consegue assistir a vídeos no YouTube sobre o tema, porém tem dificuldade de analisar detalhes, como o posicionamento do pé. É nesse momento que entra o instrutor.

– A gente treina como todo skatista. Mesma manobra, mas com a bengala. O Fernando não consegue só assistir e assimilar. Então, eu pego as mãos dele para tentar mostrar o posicionamento do pé no skate. Para isso, eu preciso aprender a manobra, entender mais sobre ela e descrevê-la com palavras e detalhes – comenta o instrutor.

Em parceria, Fernando e Léo estão adicionando a bengala aos movimentos do skate. O processo é complexo, mas facilita na autonomia e na visão do Fernando quando está sobre rodas.

A bengala ajuda Nando a fazer a transição entre as manobras  — Foto: Léo Scott

A bengala ajuda Nando a fazer a transição entre as manobras — Foto: Léo Scott

Apesar dos desafios, que não são poucos, Fernando assume que o skate é a sua terapia.

– A bengala são os olhos dele. Ele reconhece os obstáculos com ela. Estamos desenvolvendo esse método – comenta Léo.

– A hora voa. Passa rápido quando a gente gosta – afirma o skatista.

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Fontes: Ge – Globo Esporte.

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