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Renzo Angerami – Animais: seres sencientes

Os animais eram tratados como “coisas” pelo arcaico Código Civil de 1916. A Constituição Federal de 1998, por sua vez, dedicou um capítulo ao Meio Ambiente,

Renzo Angerami – Animais: seres sencientes
Renzo Angerami – Animais: seres sencientes

Redação Publicado em 19/07/2020, às 00h00 - Atualizado às 12h03


Animais: seres sencientes

Os animais eram tratados como “coisas” pelo arcaico Código Civil de 1916. A Constituição Federal de 1998, por sua vez, dedicou um capítulo ao Meio Ambiente, onde destacou a proteção à fauna, vedando, de forma expressa, a crueldade contra os animais.

Contudo, embora a Carta Constitucional tenha dado um importante passo na direção do Direito dos Animais, o Código Civil de 2002, na contramão do Direito contemporâneo, nos mesmos moldes de seu antecessor, ainda considera os animais como coisas, como semoventes.

A razão, ao longo dos séculos, consolidou a superioridade humana em relação aos animais não-humanos. Entretanto, essa pretensa superioridade, ao invés de transformar o animal-homem em defensor de todas as demais espécies, o transformou em verdadeiro predador.

Em nome de interesses econômicos, para entretenimento ou para sua própria satisfação, o homem rotulou os animais não-humanos como objetos despersonificados, desprovidos de direitos e de sentimentos.

A ideia secular de considerar um animal como coisa avaliza dezenas de condutas imorais que nos deparamos cotidianamente, como o descarte indiscriminado de animais domésticos, o tráfico de animais silvestres, maus-tratos, entretenimentos bizarros (rinhas de galos e cachorros, farra do boi, tourada, animais em circos), além de uma série incontável de outras formas de abuso.

A Ciência tem desempenhado um papel de suma importância para a quebra desse paradigma cruel em face dos animais não- humanos. Na atualidade muitos cientistas têm desenvolvidos sérios estudos que demonstram que os animais não-humanos são  sencientes.

Grosso modo, seres sencientes são àqueles que a despeito de não ser racionais, na acepção técnica da palavra, apresentam estrutura nervosa semelhante a do homem, com capacidade de  sentir alegria, tristeza, medo, afeto, dor, raiva, solidão, amor, angústia,  stress etc. Logo, tendo evidente capacidade de sentir, não podem ser tratados como coisas.

Não obstante ao patente equívoco do Código Civil de 2002 em manter o status dos animais como coisas, é possível perceber uma significativa mudança no comportamento dos brasileiros, que dia a dia, vem reconhecendo os animais como seres sencientes.

No que se refere à relação entre homem e animal, há bem pouco tempo, era muito comum ouvir: o “dono do cachorro”, o “dono do gato”, o que denotava mera relação de propriedade, como se o animal fosse um objeto qualquer. Hoje o termo “dono”, mormente quando se fala na relação entre humanos e animais domésticos,   vem sendo substituído pela expressão “tutor”, palavra comumente utilizada para identificar aquele que cuida dos interesses daqueles que têm sua capacidade intelectual reduzida por algum motivo, mas nem por isso deixam de ter sentimentos.

Países como Áustria, Suíça, Holanda, França, Portugal, México, dentre outros, já “descoisificaram” os animais, reconhecendo-os em seus diplomas legais como seres sencientes, detentores de direitos específicos.

No Brasil, há, também, uma série de projetos de lei tramitando no Congresso Nacional que buscam o reconhecimento dos animais como seres sencientes e, por conseguinte, sujeitos de direito. Um exemplo é o PL 27/18, já aprovado no Plenário do Senado Federal, que visa alterar Lei nº 9.605/98, com efeitos no Código Civil, a fim de reconhecer os animais como seres sencientes e criar um regime jurídico sui generis de sujeitos de direitos.

É certo que há uma tendência mundial em se proteger e reconhecer o Direito dos Animais, mas o caminho ainda é longo e árduo. Para que a civilização progrida, especialmente no que tange a seus valores éticos, é necessário que Ciência, Direito e Sociedade busquem o mesmo norte.

Ainda que haja evolução técnica e cientifica, jamais haverá avanço moral enquanto a vida em todas as suas formas não for respeitada e valorizada.

Não há que se falar em transformação moral e ética enquanto o homem não deixar de lado sua mesquinhez e se colocar no seu verdadeiro papel, qual seja, o de protagonista na defesa daqueles que como ele sentem dor e amor, mas que em razão de suas peculiaridades e necessidades próprias não têm voz, e, por conseguinte não têm como se defender.

Se você quiser saber mais sobre o tema, acesse Facebook: @leisebichos.

Renzo Angerami é idealizador do Projeto Leis e Bichos

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