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A “fraquejada” de Barroso

por Reinaldo Polito

A “fraquejada” de Barroso
A “fraquejada” de Barroso

Redação Publicado em 15/08/2021, às 00h00 - Atualizado às 10h55


por Reinaldo Polito

A “fraquejada” de Barroso

A escorregadela de Barroso viralizou! O ministro Luís Roberto Barroso não poderia ter sido mais infeliz ao dizer em conversa informal: “eleição não se ganha, se toma”. Essa conversa foi gravada no dia 9 de junho, mas correu nas redes sociais como rastilho de pólvora só nessa terça-feira, dia 10. E para complicar ainda mais, pressentindo consequências negativas ele pergunta no final: “Tá com som?”. Ou seja, tomara que ninguém fique sabendo do que acabei de dizer.

O gabinete do ministro se apressou em explicar que a frase foi tirada de contexto. Segundo disseram, ele se referia ao “tempo do voto impresso” em Roraima. Aceitar a versão do ministro, porém, depende de quem a interpreta. Se o crítico pertencer à turma que faz oposição a ele, a sentença será de condenado. Se for da ala dos passadores de pano, dirá que se tratou apenas de uma tirada espirituosa.

Em outra circunstância, talvez o fato pudesse até passar meio despercebido. Com essa polêmica do voto auditável, entretanto, e com a contenda acirrada que tem travado com Bolsonaro, suas palavras ganharam dimensão inimaginável.

Como a fala do ministro, pelo menos remotamente, lembra a frase proferida por José Dirceu, quando o ex-homem forte do PT disse “vamos tomar o poder, que é diferente de ganhar eleição”, as opiniões pegaram fogo. O próprio presidente Bolsonaro não apalpou: “A gente vê um cidadão andando pelos corredores da Câmara, repetindo exatamente o que falou José Dirceu”.

Esse é um dos conselhos que dou aos meus alunos políticos logo na primeira aula do curso de oratória: diante de jornalistas ou de opositores jamais fale com ironias ou frases subentendidas. Mesmo sabendo tratar-se de uma brincadeira, vão pegar suas palavras ao pé da letra e criticá-lo.

Temos episódios históricos de personalidades que fizeram brincadeiras em momentos totalmente inadequados. Bolsonaro, por exemplo, quando ainda era deputado, disse que tinha tido quatro filhos, mas aí deu “uma fraquejada e nasceu uma menina”. Os jornalistas e a oposição não perdoaram, ainda que o contexto daquele pronunciamento deixasse claro que ele só estava brincando, passou a ser chamado de misógino. Até hoje, vira e mexe ele precisa explicar que interpretaram suas palavras de forma equivocada.

Outro exemplo que se tornou célebre foi protagonizado por Ciro Gomes quando era casado com a atriz Patrícia Pillar. Durante a campanha presidencial em 2002, ao responder aos jornalistas qual o papel da esposa na campanha, deu uma “fraquejada” e resolveu brincar:

“A minha companheira tem um dos papeis mais importantes, que é dormir comigo. Dormir comigo é um papel fundamental”. Falou, percebeu que fizera asneira e tentou explicar: “Evidentemente que estou brincando. Essa minha companheira tem uma longa tradição de manejar assuntos sociais, tem muita inteligência, muita sensibilidade. Tenho a imensa satisfação de poder contar com as opiniões dela e com a militância dela, que tem sido muito generosa”.

Explicou do jeito que pôde, mas não adiantou, pois a imprensa sentiu o cheiro de sangue e partiu para a jugular – tem razão, mas vai preso. Por causa dessa resposta impensada o candidato perdeu uma fatia expressiva do eleitorado, principalmente das mulheres. Também nesse caso, ainda hoje Ciro é obrigado a dar explicações que suas palavras não passaram de uma brincadeira infeliz.

Por isso, não importa o que diga o ministro. O estrago está feito. Por mais coerentes que sejam as suas justificativas, a turma não vai se esquecer tão cedo desse deslize. Provavelmente essa sua declaração nunca desaparecerá. Sempre que surgir um bate-boca dele com algum desafeto, essa frase será lembrada com todas as letras. Ele recorrerá às mesmas explicações que acaba de dar, mas jamais poderá dizer que não disse o que disse. Talvez não tenha dito com a intenção literal das palavras, mas, para quem estiver interessado em atacá-lo, esse será apenas um detalhe sem nenhuma importância.

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