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Quatro desafios do Brasil

Imagem Quatro desafios do Brasil

Redação Publicado em 06/07/2022, às 00h00 - Atualizado às 09h03


A qualidade do debate político tem deteriorado substancialmente nas últimas décadas. Embora tenhamos a impressão de que o acirramento do debate e da polarização política seja um fenômeno recente, sofremos, há tempos, da estigmatização das perspectivas, da profundeza superficial de ideias e de uma queda ascendente na qualidade da discussão, particularmente quanto à solução dos vários desafios que o País enfrenta.

O fato de não termos uma terceira via exequível é preocupante porque o quadro atual não enseja um cenário auspicioso de maior crescimento nos próximos anos. O horizonte eleitoral brasileiro é preocupante. A falta do surgimento de lideranças evidencia a reduzidíssima renovação nos quadros políticos, com a insistência em determinados candidatos e a repetição de modelos que já deveriam ter sido aposentados pela história e até mesmo pelo esperado amadurecimento do eleitorado.

De todas as atrocidades cometidas nos períodos de exceção no Brasil, sem dúvida, a maior e pior de todas foi a relativa à quebra democrática no período 1965-1985. Com isto, desconstruímos a democracia de tal forma que até hoje enfrentamos dificuldades para dar-lhe substância e perenidade. Convivemos, por exemplo, com vários partidos que têm donos, incoerência ideológica e total falta de projetos para gerações futuras. Copiamos o enlatado estrangeiro e transformamos tudo numa discussão política inútil e infindável. Há também uma ausência de questionamento sobre os problemas da realidade atual e de como resolvê-los. A imprensa, que deveria ser a guardiã da sociedade, infelizmente, assume, muitas vezes, um lado do espectro político e perde a isenção necessária para avançar a democracia de um país que tem pouco tempo de consolidação democrática.

Em breve, os debates presidenciais, uma vez mais, evidenciarão esse quadro lastimável: candidatos e entrevistadores revelarão falta de preparo quanto aos problemas enfrentados e uma visão distorcida sobre um País que poderia muito mas que insiste em ser medíocre. E pouco se falará sobre as medidas que poderiam alterar, efetivamente, os rumos do Brasil e colocá-lo numa tendência positiva de crescimento e desenvolvimento nos próximos anos. Os gargalos históricos que o Brasil tem – infraestrutura, tributação, burocracia, corrupção e protecionismo – serão legados a um segundo plano e nos veremos perdidos numa discussão política equivocada que muito pouco contribuirá para uma evolução positiva da renda per capita brasileira. No tocante a outras propostas, veremos repetirem-se mantras que revelam uma total falta de perspectiva sobre o País, suas riquezas, potencialidades e o seu maior ativo, que é a sua população. Os políticos prometerão fazer coisas para cuidar das pessoas. Florescerão candidaturas que pregam o “amor”. Melhor seria se construíssem um legado que assegure a prosperidade das futuras gerações, conserve e melhore o que já existe. É preciso sobrepujar e vencer o espírito de mediocridade que impera no País.

A competitividade entre os países aumenta substancialmente a cada dia. Países que compreendem a dinâmica implacável da mudança preparam melhor suas populações para os desafios do futuro. O Brasil apresenta quatro vulnerabilidades que precisam ser resolvidas imediatamente. Em primeiro lugar, a falta de clareza dos objetivos de desenvolvimento do País no curto, médio e longo prazos, com um país refém de uma narrativa que se arrasta há anos quanto às reformas tributária, administrativa e política que, de fato, são importantes, porém não ocorrem porque não se tem um rumo claro do objetivo maior a ser alcançado. Em segundo lugar, a falta de um objetivo de renda per capita, que ajude o Brasil a vencer a armadilha da renda média e a encontrar um novo patamar de evolução econômica. Ao materializar uma meta de crescimento, com um valor de 15 ou 20 mil dólares per capita, por exemplo, nos próximos vinte anos, o Brasil passaria a ter um maior protagonismo global e se beneficiaria muito deste novo nível, particularmente com o aumento do emprego remunerado, que é, sem dúvida, a melhor forma de justiça social.

Em terceiro lugar, a questão educacional é uma enorme vulnerabilidade. Deveria haver um esforço intensificado do País em transformar as universidades brasileiras em centros de excelência global e investir para que, dentro de uma ou duas décadas, uma universidade brasileira esteja entre as dez primeiras universidades do mundo em produção de conhecimento e qualidade de ensino. O nível educacional brasileiro, comparativamente, é baixo e isto leva a uma mão-de-obra menos qualificada, a uma pobreza no debate e no diálogo político, além de condenar o País ao eterno ciclo da miséria.

A quarta vulnerabilidade é a segurança pública, um dos elementos determinantes da deterioração da qualidade de vida no Brasil. Infelizmente, o País se acostumou com a violência e com a ditadura do crime organizado. Da roupa que vestimos ao carro que temos, o crime determina como o brasileiro se comporta. Além disso, a maleabilidade jurídica de um sistema amigável à má conduta e à criminalidade, com juízes muitas vezes “socialmente justiceiros”, levou a uma situação em que a impunidade prevalece dos níveis mais altos até os mais baixos da sociedade. A partir do momento em que políticos corruptos são libertados em razão do arsenal jurídico utilizado, líderes de tráfico são liberados por ordens judiciais pouco claras e o valor da vida está abaixo de um tênis ou celular, a situação da violência tenderá a ser crescente.

O Brasil é um país rico, com uma população que se vê condenada à escassez e à ignorância, administrado por uma cleptocracia que retira da população não somente recursos, mas, principalmente, suas expectativas de um futuro melhor. Políticos ruins, felizmente, têm os dias contados. Infelizmente, jamais sabemos quantos dias serão. A sorte é que o Brasil é um grande país e o seu povo é resiliente. O maior problema do País é sua administração.

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