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Projetos de lei querem acabar com uso de canudos plásticos em Sorocaba e São Roque

A guerra contra o plástico já é uma realidade que o interior de São Paulo não vai deixar de viver. Dois projetos de lei foram elaborados por vereadores de

Projetos de lei querem acabar com uso de canudos plásticos em Sorocaba e São Roque
Projetos de lei querem acabar com uso de canudos plásticos em Sorocaba e São Roque

Redação Publicado em 28/08/2018, às 00h00 - Atualizado às 10h18


A guerra contra o plástico já é uma realidade que o interior de São Paulo não vai deixar de viver. Dois projetos de lei foram elaborados por vereadores de Sorocaba e São Roque com a intenção de proibir a utilização de canudos plásticos nas cidades.

O item que demora até 200 anos para se decompor tem poluído cada vez mais os oceanos.

Em Sorocaba, o texto prevê que o uso do item seja proibido, exceto os biodegradáveis, em restaurantes, bares, quiosques, ambulantes, hotéis e estabelecimentos similares autorizados pela prefeitura.

A orientação da lei, de autoria de Fernando Dini (MDB), é que sejam utilizados canudos de papel biodegradável ou reciclável. Ao G1, ele disse que a lei tenta reduzir a quantidade de lixo que se acumula em aterros sanitários, beneficiando a preservação e proteção do meio ambiente. O projeto deve ter votado na sessão ordinária desta terça-feira (28).

“O canudo plástico é um agressor até então anônimo, porque é supérfulo no nosso meio. Você usa em cinco minutos e joga fora, mas demora séculos para se desfazer no meio ambiente.”

Caso entre em vigor, o descumprimento da lei resulta, primeiramente, em advertência para coibir a irregularidade. Na segunda autuação, é prevista multa de 120 unidades fisicais, em torno de R$ 3 mil. Já na terceira autuação, dobra o valor da multa e assim sucessivamente.

Projeto de lei tenta reduzir a quantidade de lixo que se acumula em aterros sanitários (Foto: Ecosurf/Divulgação)

Projeto de lei tenta reduzir a quantidade de lixo que se acumula em aterros sanitários (Foto: Ecosurf/Divulgação)

No município de São Roque, o projeto de lei do vereador Rafael Marreiro de Godoy (PSB) também visa proibir a fabricação, comercialização, distribuição e uso do canudo plástico com o objetivo de diminuir a poluição.

O projeto orienta que os canudos plásticos sejam substituídos por produtos biodegradáveis ou que não sejam de uso único. Ao G1, o vereador informou que o texto está sendo elaborado para entrar no debate mundial sobre a poluição dos canudos plásticos. O texto ainda é analisado pelas comissões da Câmara e não tem data para ser votado.

“Resolvi abraçar a causa que é uma corrente mundial. É uma discussão sobre o uso de produtos descartáveis poluidores do meio ambiente”, explica.

Conforme o texto, será dado prazo de 36 meses, caso seja aprovado e entre em vigor, para o fim da fabricação de canudos plásticos, 48 meses para o fim da venda e 60 meses até o uso ser abolido na cidade.

Ainda caso a lei seja aprovada, o seu não cumprimento prevê, de acordo com a lei nº 9.605, “sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, e dá outras providências”.

Natureza paga a conta

Vídeo mostra biólogos retirando canudo da narina de uma tartaruga na Costa Rica  (Foto: BBC)

Biólogos retirando canudo da narina de uma tartaruga na Costa Rica (Foto: BBC)

Biólogos retirando um canudo de dentro da narina de uma tartaruga marinha na Costa Rica se tornou símbolo do prejuízo do pequeno objeto plástico para o ecossistema, e desencadeou pedidos para a redução do uso de plástico do mundo.

Os dados são alarmantes: um estudo da revista Science apontou em 2015 que o Brasil era o 16º país que mais despejava plástico nos oceanos. Além disso, uma pesquisa do Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo, em parceria com o Instituto Socioambiental dos Plásticos (Plastivida), concluiu que 95% do lixo nas praias brasileiras são de plásticos.

G1 conversou com João Malavolta, consultor técnico do Instituto Ecosurf – organização dedicada à proteção dos oceanos – sobre os problemas que o plástico causa no ambiente.

Para o especialista, as pessoas estão tornando o planeta um lugar cada vez mais difícil de viver. Além do plástico, há questões das emissões de gases de efeito estufa, derrubada de florestas, poluição de rios por rejeitos químicos, entre outras atitudades.

João Malavolta explica que existe o plástico que ajuda na qualidade de vida das pessoas e o plástico descartável. “Os plásticos duráveis utilizados em equipamentos de saúde, por exemplo, têm finalidade nobre. Ao mesmo tempo tem o plástico descartável, esse sim é o grande vilão na poluição dos corpos d’água, e está deixando o planeta plastificado.”

Segundo especialista, já se fala na ciência sobre as marcas geológicas deixadas pelo plástico nos oceanos (Foto: Ecosurf/Divulgação)

Segundo especialista, já se fala na ciência sobre as marcas geológicas deixadas pelo plástico nos oceanos (Foto: Ecosurf/Divulgação)

Segundo o especialista, já se fala na ciência sobre as marcas geológicas deixadas pelo plástico nos oceanos. “O impacto é tanto, que estudiosos acreditam que a Terra mudou de era geológica, de forma que a era atual, conhecida como holoceno, cedeu para a era conhecida como antropoceno”, diz Malavolta.

Nesta nova época os seres humanos substituíram a natureza como a força ambiental dominante no planeta.

“No oceano, esse plástico está sendo sedimentado e misturado com outros sólidos e virando plastiglomerado, uma composição plástica que vai ficar no planeta por talvez milênios. A gente está tornando a Terra um planeta de plástico”, afirma Malavolta.

A vida útil de um canudo é o tempo suficiente para você terminar a sua bebida, o que dá uma média de quatro minutos. Normalmente feitos de polipropileno ou poliestireno, os itens demoram até 200 anos para se decompor na natureza.

Consultor da ONG Ecosurf explica que os canudos plásticos se desintegram e acabam engolidos pelos animais (Foto: Chris Gordan/Ecosurf/Divulgação)

Consultor da ONG Ecosurf explica que os canudos plásticos se desintegram e acabam engolidos pelos animais (Foto: Chris Gordan/Ecosurf/Divulgação)

Os canudos correspodem a 4% de todo o lixo plástico encontrado no mundo, segundo dados da ONG Ocean Conservancy, sediada nos Estados Unidos. O estudo apontou também que foi o 7º item mais coletado nos oceanos em todo o mundo em 2017.

Quando descartados, os canudos se desintegram em pequenas partes, que chegam aos oceanos e acabam engolidas pelos animais. “Por ser um plástico de baixa densidade, tem uma degradação fotoquímica mais rápida. Então ele vai se quebrando em micropartículas e permite interação com animais da biodiversidade marinha”, explica João Malavolta.

Mudança de comportamento

Além do canudo de papel, existem opções em bambu, inox e vidro (Foto: Marcos Serra Lima/G1)

Além do canudo de papel, existem opções em bambu, inox e vidro (Foto: Marcos Serra Lima/G1)

No Brasil, o município do Rio de Janeiro se tornou a primeira cidade brasileira a proibir o uso de canudos plásticos. A medida foi aprovada pela Câmara de Vereadores e sancionada pelo prefeito Marcelo Crivella.

Para um lojista de Sorocaba que atua no ramo de embalagens, e preferiu ter a identidade preservada, o mercado de plástico chegou a movimentar 50% dos itens vendidos na loja. Atualmente, o comércio registra queda de 20% a 30% na vendas de produtos de plástico. Sobre os canudos, a expectativa dos comerciantes é que outros materiais substituam o plástico.

Várias alternativas já são usadas, como canudos de metal, de papel, de vidro e até comestíveis. As lojas estão começando a se adaptar para o novo mercado de opções sustentáveis.

Conforme apurado pelo G1, algumas lojas de embalagens de Sorocaba vendem canudo de papel, mas o preço ainda é superior ao de plástico:

  • Um pacote com 100 unidades de canudos plásticos comuns é encontrado em lojas de embalagens por, em média, R$ 3,99, sendo que a unidade do canudo sai por aproximadamente R$ 0,03;
  • Um pacote de canudos de papel com 20 unidades é encontrado a diferentes preços, de R$ 4,40 e R$ 7,99, podendo chegar a R$ 0,39 a unidade, uma diferença de aproximadamente 1.300%.

Além da diferença do preço, os pacotes de canudos de papel são vendidos em menores quantidades. Para o lojista ouvido pelo reportagem, os preços dos canudos biodegradáveis devem diminuir na medida que a demanda aumentar.

Canudo de papel é opção para substituir o plástico (Foto: Divulgação)

Canudo de papel é opção para substituir o plástico (Foto: Divulgação)

Necessidade

O debate sobre o fim dos canudos plásticos também envolve a utilidade do item como instrumento de alimentação para pessoas com deficiência. Em entrevista ao G1, a fisioterapeuta Regislaine Soares conta que a Associação dos Deficientes da Região de Sorocaba atende vários pacientes que utilizam canudos.

“Pessoas com lesões neurológicas têm comprometimentos que resultam em aspectos no corpo, alguns não conseguem se movimentar e outros não conseguem segurar um copo sem derrubar, por isso eles usam canudos.”

Para a profissional, é possível substituir o plástico por canudos feitos com outros materiais, como o papel. Já o canudo de metal não é adequado para os pacientes porque pode machucar, mas é possível adequar os diferentes tipos de canudos à necessidade de cada paciente.

“Não sou a favor de banir totalmente, mas sim de substituir. Com o canudo de papel dá para mudar o ângulo e então o paciente consegue ter outros meios para ingerir o líquido, é possível que seja adequado para cada um.”

Para o consultor técnico do Instituto Ecosurf, é importante enfatizar que o debate sobre a redução do uso de plástico é sobre o material de uso único descartado. “A principal alternativa é a mudança comportamental, as pessoas precisam se questionar se o canudo vai fazer diferença na hora de ingerir o líquido, se é possível tomar no copo. Passa pelo cidadão a tomada de decisão e repensar o consumo.”

Além disso, há formas de substituir o material plástico por canudos de outros materiais ou por canudos não descartáveis:

  • Prefira beber direto do copo ou garrafa (dê preferência a algum material que não seja plástico);
  • Comece a usar canudos reutilizáveis de metal, vidro ou bambu (canudos personalizados);
  • Use canudos de material biodegradável, como os de papel.

Para João Malavolta, as leis que proíbem a distribuição de canudos plásticos têm um componente de efeito pedagógico.

“As pessoas se questionam sobre os motivos da lei e em uma pesquisa rápida é possível ver o desafio enorme que a gente tem que enfrentar com a catástrofe dos plásticos nos oceanos.”

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