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Os segredos dos pais no Ártico para ensinar sobrevivência aos filhos

Todos os anos, nos meses de junho ou julho, sob o sol da meia-noite do Ártico, famílias de pastores de renas do povo sami no norte da Finlândia, Noruega e

Os segredos dos pais no Ártico para ensinar sobrevivência aos filhos
Os segredos dos pais no Ártico para ensinar sobrevivência aos filhos

Redação Publicado em 28/03/2022, às 00h00 - Atualizado às 07h17


Todos os anos, nos meses de junho ou julho, sob o sol da meia-noite do Ártico, famílias de pastores de renas do povo sami no norte da Finlândia, Noruega e Suécia se reúnem para um dos maiores eventos sociais do ano: marcar os novos filhotes de renas para identificá-los.

A pé, a bordo de quadriciclos e até helicópteros, eles localizam e reúnem as renas semiselvagens que vivem soltas por vastas áreas, espalhadas por dezenas de quilômetros quadrados.

A expectativa é de que as crianças pequenas participem do evento. Os meninos e meninas mais novos ajudam a pegar os filhotes. E, a partir dos 10 anos, empunham suas próprias facas de marcação, seguram o filhote e marcam ambas as orelhas dele com um padrão único de corte.

As crianças recebem um padrão de marcação próprio ao nascer e o utilizam para marcar seus rebanhos pelo resto da vida.

Entre os sami, povo indígena espalhado pelas regiões mais ao norte da Noruega, Suécia, Finlândia e Península de Kola, na Rússia, as crianças não apenas participam do trabalho de pastoreio, como também são incentivadas a agir de forma independente na maioria das outras áreas da vida.

Independência a -30ºC

Elas podem decidir quando comer, quando dormir e o que vestir, mesmo em temperaturas de -30 °C. Para quem vê de fora, essa independência pode surpreender.

Missionários que visitaram o Ártico no século 18, escreveram depois em seus diários que parecia que as crianças sami podiam fazer o que quisessem e que faltava a elas disciplina.

No entanto, como pesquisas revelam cada vez mais, o modo sami de criar os filhos, aparentemente sem regras, tem sua própria filosofia e estrutura complexa.

Com o tempo, esse estilo parental único evoluiu para preparar as crianças para lidar com os desafios extremos da vida no Ártico – e promover um tipo particular de resiliência.

Uma das suas diretrizes é que, em vez de seguir uma rotina fixa, toda a família se adapta a quaisquer tarefas que precisem ser realizadas, seja a marcação de rebanhos, alguma viagem ou outras atividades conjuntas.

Dentro dessa estrutura, as crianças fazem suas próprias escolhas.

“Elas comem quando estão com fome e vão para a cama sempre que estão cansadas”, diz Tytti Valkeapää, mãe de seis filhos, com idades entre 8 e 18 anos, que mora na aldeia finlandesa de Kuttanen, na fronteira com a Suécia.

Embora Valkeapää não tenha nascido na cultura sami, ela se adaptou ao modo de vida local depois de se casar e entrar para uma família de pastores de renas sami.

Vida mais moderna

Como a grande maioria dos sami, sua família não é mais totalmente nômade – eles passaram a se deslocar bastante em motos de neve, o que transformou a vida dos pastores de renas e permitiu que eles se tornassem mais sedentários.

Mas, embora vivam principalmente em casa, as atividades tradicionais, como o ritual de marcação, ainda ditam o ritmo da família.

O processo de marcação leva várias semanas – e só é realizado à noite, quando ainda está claro, mas mais frio do que durante o dia. Isso torna menos estressante para as renas e seus filhotes.

Para poder realizar o trabalho em conjunto, toda a família muda seu ciclo de sono, trocando a noite pelo dia.

As crianças ficam acordadas a noite toda, trabalhando e brincando, por semanas a fio, junto com suas famílias e colegas pastores.

Elas tiram uma soneca durante o dia, cochilando sempre que têm vontade.

“Eu e as crianças podemos cochilar em um quadriciclo, em uma moto de neve, sob uma capa de chuva em um trailer ou em nossa van”, diz Valkeapää.

“Você só precisa ser capaz de descansar e comer sempre que puder. Durante a marcação, as crianças costumavam gostar de dormir em um lávvu (barraca), mas hoje temos uma pequena cabana lá.”

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G1

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