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O Brasil continua ignorando os órfãos da Covid

Por Amilton Augusto

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Redação Publicado em 21/09/2021, às 00h00 - Atualizado às 07h48


Por Amilton Augusto

O Brasil continua ignorando os órfãos da Covid

O Brasil bateu a marca de quase 600 mil mortos pela Covid-19, o que não tem sequer perspectiva de fim, mesmo com o avanço da vacinação, especificamente em razão das novas variantes, entre elas as mais temidas do momento, que são as variantes Delta e Mum, que tem preocupado especialistas por todo o Brasil e feito aumentar o número de internações em alguns estados.

A gravidade e o impacto da pandemia trouxe ao Mundo inúmeras mudanças no perfil de vida da população, que precisou se adaptar ao uso permanente de máscara e a constante higienização das mãos, com vias a evitar o contágio dessa doença tão avassaladora e que fez tantas vítimas, devastando, por vezes, famílias inteiras.

Ocorre que, há um outro fator que tem trazido um alerta para autoridades e governos em todo o Mundo e, em especial aqui no Brasil, que são as crianças e adolescentes que perderam seus pais em decorrência da doença, os denominados órfãos da Covid, que traz um grave problema, não só social, emocional e familiar, mas também em relação à economia e assistência social, fazendo necessária a rápida implementação de políticas públicas eficazes no sentido de cuidar e protegê-las.

Segundo dados oficiais, o Brasil tem um órgãos por Covid a cada 5 minutos, o que demonstra claramente o impacto da doença nas crianças e adolescentes, justamente aqueles a quem se imaginava estarem imunes ao vírus. São mais de 130 mil menores de idade que perderam o pai, a mãe ou ambos para a doença, o que, caso se considerem as crianças e adolescentes que tinham como principal cuidador os avós/avôs, esse número salta para mais de 150 mil no país, cifra que ultrapassa a marca de 1,5 milhão de órfãos no Mundo.¹

O problema é que, como se criou a máxima de que as crianças e adolescentes não seriam afetadas pelo doença, pouca importância se dedicou a elas, o que se verifica justamente o oposto, diante de tantos números, porém, gerando uma sensação global de ignorar ou a implementação quase zero, ou muito lenta, de políticas públicas para atendimento a tais demandas sociais, cuja situação social é tão extrema, em especial por se tratarem de seres tão vulneráveis.

A situação é tão grave que o número de menores brasileiros que ficaram órfãos multiplica por 180 os cerca de 1.200 óbitos na faixa etária de até 19 anos, desde o começo da pandemia, conforme dados do Ministério da Saúde, dados que colocados em proporção, correspondem a uma taxa de 2,4 órfãos para cada mil brasileiros menores de idade, a quarta maior entre 21 países incluídos no estudo, que em termos absolutos, os números do Brasil só não são piores que os do México, que registra pouco mais de 141 mil órfãos, ou 3,5 por mil.²

Muito além da tragédia familiar e do impacto emocional da perda de pai e/ou mãe, há o impacto financeiro e social, tendo em vista que muitos dos que morreram em decorrência da pandemia eram as principais fontes de renda da casa, o que torna de extrema urgência e necessidade o debate no Congresso Nacional sobre a criação de um programa social de transferência de renda para esses menores de idade, com vias a evitar a vulnerabilidade que surge junto com a perda familiar.

Fato é que, no Congresso já tramitam diversos projetos que visam a implementação de tais políticas públicas, mas que até agora estão parados, em lenta tramitação, em especial no Senado Federal onde se encontra o PL nº 2.180/2021, que busca garantir aos menores de 18 anos amparo financeiro custeado pelo Fundo de Amparo às Crianças Órfãos (FACOVID), de autoria da Senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA). Por sua vez, o governo federal já anunciou que planeja pagar uma pensão para esses órfãos já inscritos em programas sociais, algo em torno de 68 mil menores de idade, segundo estimativas.

Porém, falácias a parte, nenhuma dessas propostas e promessas saíram do papel até o momento, agravando ainda mais a situação dessas família, causando ainda mais desigualdade social, onde sequer imaginava que ocorreria. É de extrema importância que o Congresso Nacional haja rápido, pois a velocidade com que a Covid-19 destrói as famílias não deixa espaço para qualquer preparação, seja ela psicológica ou material.

Assim, embora diante da gravidade da situação, o Congresso e o Governo seguem inertes, situação que demonstra claramente a necessidade de que os políticos tenham sensibilidade social para entenderem que, para além de uma tragédias familiar, trata-se de uma tragédias humanitárias, exigindo a imediata implementação de projetos sociais com vias a auxiliar essas crianças e adolescentes que, além de órfãos, são cidadãos brasileiros sobreviventes de uma guerra silenciosa.

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¹ https://www.bbc.com/portuguese/brasil-57923377

² https://www.istoedinheiro.com.br/pandemia-oculta-covid-19-deixou-mais-de-130-mil-orfaos-no-pais-revela-estudo/

*Amilton Augusto

Advogado especialista em Direito Eleitoral e Administrativo. Vice-Presidente da Comissão de Relacionamento com a ALESP da OAB/SP. Membro julgador do Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/RJ. Membro fundador da ABRADEP – Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (2015). Membro fundador e Diretor Jurídico do Instituto Política Viva. Membro do Conselho Consultivo das Escolas SESI e SENAI (CIESP/FIESP). Coautor da obra coletiva Direito Eleitoral: Temas relevantes – org. Luiz Fux e outros (Juruá,2018).  Autor da obra Guia Simplificado Eleições 2020 (CD.G, 2020). Coautor da obra Dicionário Simplificado de Direito Municipal e Eleitoral (Impetus, 2020).  Palestrante e consultor. E-mail: [email protected].
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