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Moro pode ter tomado a decisão equivocada na hora errada?

Por Reinaldo Polito

Moro pode ter tomado a decisão equivocada na hora errada?
Moro pode ter tomado a decisão equivocada na hora errada?

Redação Publicado em 23/01/2022, às 00h00 - Atualizado às 09h17


Por Reinaldo Polito

Moro pode ter tomado a decisão equivocada na hora errada?

A história está aí para nos ensinar. Temos exemplos de sobra para saber que, às vezes, as pessoas são enganadas pelas circunstâncias e que, se refletissem um pouco, não tomariam determinadas iniciativas. Especialmente quando ocupam cargos importantes, revestidos de grande poder passam a viver como em um mundo à parte em que é o astro-rei, e tudo parece girar ao seu redor

Sergio Moro, quando exercia as funções de juiz na 13ª Vara de Justiça de Curitiba, liderando a Força-Tarefa da Lava Jato, era aclamado por onde se apresentasse. Recebia aplausos nos aviões, nos teatros, nos eventos sociais, dentro e fora do país. Boa parte da população brasileira destacava a coragem, a competência e a retidão do magistrado.

Chamado de herói da pátria, chegou a ser a pessoa mais admirada do país. Por isso, passou a ser cortejado por todos aqueles que aspiravam receber um pouco de suas luzes. Candidatos à presidência, como Álvaro Dias, por exemplo, durante a campanha revelaram que, se eleitos, o receberiam de braços abertos para ocupar o Ministério da Justiça.

Assim que venceu as eleições presidenciais, Bolsonaro pediu a ajuda de Paulo Guedes para fazer o convite. Moro aceitou abandonar mais de 20 anos de carreira como juiz para fazer parte do novo governo. Um tento e, ao mesmo tempo, um risco para o presidente, pois existe uma máxima de que não se admite quem não se pode demitir.

Também como ministro da Justiça e Segurança Pública, sua imagem foi projetada de maneira bastante positiva. Até no momento em que os hackers divulgaram algumas de suas mensagens com os procuradores, que, se fossem verdadeiras, poderiam arranhar sua reputação, ainda assim os brasileiros o apoiaram. O próprio presidente o acompanhou aos estádios de futebol para que fosse ovacionado pela torcida.

Imaginando que essa aceitação seria definitiva, depois de 16 meses no ministério, resolveu sair do governo. Em um primeiro momento, houve certa comoção geral. Muitos julgaram que a sua renúncia enfraqueceria Bolsonaro. Os mais afoitos até afirmaram que, com a saída do ministro, aquele governo chegaria ao fim. Passado um tempo, todavia, tudo voltou à normalidade, e quase ninguém mais falava em Sergio Moro.

Ele descobriu que o sucesso se esvaecia, e que, se quisesse conquistar projeção, especialmente para concorrer ao cargo de presidente, teria de reconstruir sua boa imagem. Na verdade, quando abandonou o barco, talvez imaginasse que seu papel na sociedade fosse mais proeminente do que verdadeiramente era. Decisão equivocada na hora errada?

Tivesse Moro revirado algumas páginas da história recente, talvez sua decisão fosse distinta daquela que tomou. Bastaria recordar o que aconteceu com Jânio Quadros na época em que foi presidente. Com menos de sete meses no poder, em 25 de agosto de 1961, ele enviou um bilhete ao Congresso Nacional informando que deixava a presidência do Brasil.

Bilhete com o pedido dede renúncia de Jânio Quadros

Bilhete com o pedido de renúncia de Jânio Quadros

Muitos que acompanharam aquele tumultuado momento da política brasileira concluíram que Jânio tentou com essa atitude dar um autogolpe. Imaginou que o Congresso não aceitaria seu pedido de renúncia, que as Forças Armadas tentariam demovê-lo daquela decisão, e que, principalmente, a população, que o elegera com enorme votação, se mobilizaria para persuadi-lo a continuar.

Nada disso, porém, aconteceu. O Congresso aceitou o pedido de renúncia, as Forças Armadas não se manifestaram, e a população ficou surpresa, mas não colocou nenhum obstáculo à sua saída. Decisão equivocada na hora errada.

Não foi muito diferente com o ex-presidente Fernando Collor, quando se sentiu pressionado pela oposição, que convocara uma CPI no Congresso. Em uma reunião, no dia 13 de agosto de 1992, com um grupo de taxistas no Palácio do Planalto, pensando que a população que o elegera cerraria fileiras com ele, fez um discurso inflamado conclamando a todos os brasileiros que, no domingo seguinte, fossem às ruas vestidos de verde e amarelo. Segundo ele, seria a demonstração de apoio da maioria que trabalha contra a minoria que atrapalha.

Não deu certo. A manifestação liderada pelos caras-pintadas, que eram os jovens descontentes com seu governo, ao lado do povo, ocorreu em todo o país com as pessoas vestidas de preto, como sinal de protesto. Pouco tempo depois, Collor sofreria o impeachment e deixava o governo. Ele se enganou ao pensar que era mais importante e poderoso do que o consideravam. Decisão equivocada na hora errada.

Todos nós podemos aprender com essas experiências. Será que somos tão relevantes quanto, às vezes, imaginamos ser? Ao escolhermos caminhos que dependam da adesão das pessoas, precisamos calçar as sandálias da humildade e avaliar se não estamos tomando a decisão equivocada na hora errada. Siga pelo Instagram @polito

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Reinaldo Polito é Mestre em Ciências da Comunicação e professor de oratória nos cursos de pós-graduação em Marketing Político, Gestão Corporativa e Gestão de Comunicação e Marketing na ECA-USP. Escreveu 34 livros com mais de 1,5 milhão de exemplares vendidos em 39 países. Siga no Instagram @polito pelo facebook.com/reinaldopolito pergunte no [email protected]
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