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Lugano não acreditava em título com Fernando Diniz e vê “melhor elenco da década” no São Paulo

Diego Lugano não acreditava que o São Paulo poderia ser campeão com o estilo de futebol praticado pelo time sob o comando do ex-técnico Fernando Diniz.

Fernando Diniz
Fernando Diniz

Redação Publicado em 02/03/2021, às 00h00 - Atualizado às 15h58


Uruguaio era contra estilo de jogo do ex-técnico e põe plantel de 2020 só abaixo do Flamengo; em entrevista ao ge, ex-dirigente revisita passagem de três anos em “outro lado” do Tricolor

Diego Lugano não acreditava que o São Paulo poderia ser campeão com o estilo de futebol praticado pelo time sob o comando do ex-técnico Fernando Diniz.

O relato do uruguaio é de sequer ter sido consultado na época da contratação, em setembro de 2019, e saber da notícia por meio de um conselheiro, enquanto inaugurava um camarote no estádio do Morumbi.

Então diretor de relações institucionais, Lugano diz ter falado ao antigo treinador e ao ex-diretor executivo de futebol Raí dessa discordância de visão de futebol. Ele entendia que o melhor seria uma troca no comando do time.

– À medida que o tempo encurtava e a urgência de ganhar era maior, na minha maneira de ver não achava como a gente ser consistente em jogos importantes de mata-mata ou decisivos com aquela forma de jogar. Não achava, sinceramente. Foi o que tentei fazer a direção entender, que tinha de mudar a forma de jogar para tentar aproveitar esse elenco para obter títulos ainda nesse ano antes de sair. Simplesmente isso, com todo respeito ao treinador e a tomada de decisão. São formas de ver futebol e era minha obrigação por estar lá falar o que achava e pensava – disse Lugano.

– Em algum momento com muito respeito conversei (com Diniz). Entendia que meu vínculo era o Raí, mas um pouco por lealdade, por ser honesto, conversei com ele sobre isso. Que era hora de mudar o estilo de jogar. Só isso. Não houve briga, nem discussão. Pontos de vista de futebol diferentes. Não da maneira de sentir. Ele disse que entendia que daquela maneira iria ganhar. Eu entendia que daquele jeito não via como ganhar. Simplesmente isso – completou.

Justamente por ter essa visão diferente, Lugano se afastou do dia a dia do futebol no CT da Barra Funda. No segundo semestre ele “sumiu”, depois de ter postura ativa nos jogos do São Paulo e até nas redes sociais na primeira metade do ano.

– Muito convencido da ideia dele. Um cara muito legal, muito obcecado. Bonito de ver como defende a ideia dele. Mas estava na obrigação de colocar meu ponto de vista, porque estava meu prestígio e o do Raí em jogo. Éramos os que tinham prestígio a perder. E perdemos, aliás.

Nesta entrevista exclusiva ao ge, Lugano passa a limpo sua trajetória de três anos como dirigente do São Paulo.

Ele revela sua atuação na contratação de Daniel Alves, diz ter sido um erro duplo a demissão de Diego Aguirre e a escolha de André Jardine como substituto por considerar que o processo foi apressado para o então técnico da base, e afirma que o São Paulo formou em 2020 o segundo melhor elenco do Brasil, atrás apenas do Flamengo, e o mais forte do clube na década.

Lugano também admite decepção com Gonzalo Carneiro, contratação indicada por ele, opina a respeito de Hernán Crespo e diz que sai com imagem “arranhada” pela falta de títulos. A entrevista foi feita no dia 18 de fevereiro, antes do jogo entre São Paulo e Palmeiras, empatado por 1 a 1.

Raí e Lugano no jogo do São Paulo contra o Binacional, em Juliaca — Foto: São Paulo FC / divulgação

Raí e Lugano no jogo do São Paulo contra o Binacional, em Juliaca — Foto: São Paulo FC / divulgação

ge: Como surge o convite para você virar dirigente do São Paulo?

Lugano: Os últimos meses do ano de 2017 foram muito complicados, talvez o mais complicado na minha vida esportiva, com São Paulo brigando contra o rebaixamento. Obviamente que eu com minha personalidade, por ter uma influência muito grande dentro do São Paulo para sustentar aquilo, imagino que por isso recebi o convite do Vinicius Pinotti (então diretor de futebol) para ficar no São Paulo como jogador ou dirigente. Depois me aposentei e o Leco me oficializou como diretor. Imagino para aproveitar um pouco a experiência, sensibilidade dentro do São Paulo que havia ficado muito mais fina e intensa nos últimos meses.

Na conversa, qual foi a função combinada para você fazer?

– Na verdade, o Vinicius queria realmente que eu ficasse 100% controlando e assistindo futebol como um diretor esportivo, mas falei que era muito recente minha saída como jogador. Tinha um vínculo muito intenso com jogadores e funcionários do CT. Não seria um cara objetivo para tomar decisões nessa posição, quando tem um relacionamento tão íntimo. Dividimos meses intensos e a relação fica ainda mais forte. Obviamente aproveitando meu conhecimento, sempre fui capitão, me envolvi em muitas coisas extracampo no Uruguai, no São Paulo e conheço muito de futebol internacional. Decidimos fazer uma função mais institucional, com meu vinculo na Conmebol e a nível internacional, meu conhecimento do São Paulo como um todo. Isso é um mundo.

Entre a teoria e a prática foi do jeito que você imaginava?

– Sim, tive muita liberdade de agir para fazer meus projetos dentro do clube, coisas na Europa, na Conmebol e participar em diferentes áreas no São Paulo. Nas vezes em que fui mais ativo no CT, por necessidade ou por pedido mesmo, foi onde comecei a ter um pouquinho de dificuldade dessa transição jogador-diretor. Porque como jogador, ou eu no vestiário, estava acostumado muitas vezes por influência, carisma, imposição e argumentos a fazer o que eu entendia que era melhor. No vestiário que é mais igual se destaca quem tem mais influência.

– Já como diretor na escala hierárquica de qualquer instituição, de qualquer estrutura, eu tive de me adaptar a ter uma opinião, mas não a decisão, que é tudo ao contrário do que aconteceu comigo em 15 anos de vestiário. Isso acaba influenciando em tudo. Tinha acontecido, por exemplo, quando ainda era jogador do São Paulo. Não jogava tanto, mas governava tudo o que era o vestiário e por consequência o que acontecia no clube. Então essa talvez foi a maior dificuldade nessa transição, essa escala hierárquica que tem de respeitar.

Você queria fazer mais e não podia?

– Não. O fato de simplesmente o que você pensa não se faz. No vestiário não funcionava assim. Enfim, tentei me adaptar a isso. Talvez foi o que mais sofri, essa ansiedade na transição para jogador.

Ansiedade de quê?

– De querer fazer mais coisas, impor minha maneira de pensar e de ver futebol. Obviamente o São Paulo é um clube muito grande e muito particular. Eu também tinha que aprender muito como funciona politicamente essa instituição. É um universo muito grande. Eu como jogador não via muito como funcionava. Como diretor tive a precaução de aprender aos poucos, ainda que não me interessava, mas tive a obrigação de aprender e ver que cada decisão tem sempre uma consequência ou influência política.

– São coisas que tive de ir aprendendo. Por isso também não quis ter um protagonismo maior, também porque não entendia, e mesmo depois de três anos não entendo ainda muito bem o universo político do São Paulo. Funciona como um parlamento no meu país, por exemplo. Cada decisão tem por trás opiniões, pressões.

Conselho Deliberativo do São Paulo no Morumbi — Foto: Marcos Ribolli

Conselho Deliberativo do São Paulo no Morumbi — Foto: Marcos Ribolli

Essa política atrapalha ou ajuda?

– O São Paulo sempre foi assim e assim conquistou muita coisa. Então é difícil falar que atrapalha. Obviamente que às vezes o excesso de rivalidade interna pode prejudicar um pouquinho. Talvez o mundo de hoje exija um tipo de condução e gestão mais vertical, mas o São Paulo sempre foi assim. Têm pessoas com muita história aqui dentro, que se sentem com autoridade para também ajudar nesse constante equilíbrio que esse universo muito particular se sustenta.

O que há de tão particular nesse “universo São Paulo”?

– O Morumbi é um mundo diferente da Barra Funda. Tem muita gente, diretores, conselheiros, sócios e torcedores que são parte do clube, que por estatuto tem oportunidade de escolher o destino do São Paulo. Que opinam, tem voz, um voto. Que tem autoridade também no São Paulo. Muitas vezes isso contrasta com o mundo da Barra Funda, um pouco mais fechado, mais voltado 100% ao futebol mesmo. Os dois têm que conviver em permanente equilíbrio e harmonia, e nem sempre é assim.

– Às vezes a única maneira para que isso aconteça são que os resultados sejam positivos. Mas muitas vezes os resultados são positivos porque tem aquela perfeita harmonia. E tá sempre assim, quem vem primeiro? O ovo ou a galinha? Mas o São Paulo sempre foi assim e foi glorioso assim. Então, acho que são coisas que aprendi a conhecer. A pressão que tem o pessoal do Morumbi quando o time da Barra Funda não consegue resultados. Uma cobrança e pressão importantes.

É uma pressão muito forte?

– Muito forte, porque o pessoal é a vida do clube. E as vezes na Barra Funda não se enxerga. Eu como jogador não enxergava. Sempre falo algo que é uma história engraçada. Como capitão do São Paulo no último ano (2017) queria matar o Elias (ex-diretor financeiro do São Paulo). Tanto que uma vez chamei ele para ir ao CT para pegar ele na porrada mesmo, porque atrasava o bicho, fazia eu perder a palavra com meus companheiros. Queria matar.

– Aqui, vendo o que o cara faz para manter o equilíbrio da instituição, ver que um resultado negativo, um ingresso que não entrou, uma eliminação, o desequilíbrio que ocasiona na estrutura São Paulo, na loucura que isso gera… Pensei: “P$#@, que errado estava quando era capitão. Só olhava meu lado”. Essas coisas te fazem crescer muito e entender o equilíbrio delicado para que esse monstro cheio de interesses, estrutura… pessoas querendo fazer o bem, mas que muitas vezes não entram em acordo.

O que mais mudou de visão de jogador para dirigente?

– Quanto o resultado negativo, o jogador não conseguir conquistar o torcedor, quanto traz de problema de prejuízo para a instituição. Às vezes é difícil essa comunicação direta entre as áreas do clube, as vezes por interesse, por distancia física, as vezes por não entender mesmo. É como se o São Paulo tivesse mundos diferentes: CT da Barra Funda, Morumbi e Cotia. Não há uma interação real. É difícil equilibrar esse relacionamento. Não é fácil. Como jogador achava que deveria ser mais fácil, mas não é na realidade.

Por distância física?

– Distancia física é uma coisa e também por distancia de gestão, de maneira de pensar, diferentes objetivos a curto prazo. Essa integração real é o que sinto que mais o São Paulo deveria melhorar. Morumbi, Barra Funda, Cotia: que todos sejam um. Que as pessoas do CT saibam o que acontece no Morumbi, as pressões que diretores do Morumbi sofrem quando o time não ganha. Que Cotia esteja adaptado ao que a Barra Funda quer e funcional ao que a Barra Funda quer. Que a Barra Funda possa passar diretrizes sérias e profissionais para Cotia. Enfim, o São Paulo é muito grande, e esse equilíbrio acho que é o mais difícil de achar.

Como achar esse equilíbrio?

– Não sei. Tem mentes capacitadas para tentar fazer com que tudo funcione um pouco mais vertical, como em muitos países do mundo. Mas repito: o São Paulo é e foi vencedor assim.

Foi. Não está sendo…

– Não está sendo, mas está sempre a ponto de explodir novamente. Questão de ajustar coisas de acordo com a atualidade.

Você tinha liberdade para opinar no futebol?

– A liberdade de opinar sempre. Total liberdade tanto com Raí quanto com presidente (Leco). Obviamente que não decidir. Como falei, hierarquicamente tinha uma escala. Opinar e palpitar sobre tudo, mas decidir tem hierarquia como em qualquer estrutura.

Lugano e Diego Aguirre: diretor e técnico trabalharam juntos no São Paulo de 2018 — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net

Lugano e Diego Aguirre: diretor e técnico trabalharam juntos no São Paulo de 2018 — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net

Qual foi sua participação na contratação do Diego Aguirre como técnico?

– Direta. Estávamos discutindo sobre treinadores e do que entendia do elenco. Um pouco pequeno que quase cai no ano anterior. Tinha saído Hernanes, Pratto e eu. O Paulista foi muito mais para parte de baixo da tabela do que de cima. Pensamos em um treinador que fosse bom taticamente, competitivo, coletivo acima das individualidades, que encara o momento de elenco não muito grande. Quando falei o nome do Diego, o Raí foi o primeiro aceitar, porque conhecia. Foi uma participação direta mesmo. Na época, ele era o único treinador que aceitava o Jardine como auxiliar. Outros não aceitavam.

E como viu a saída do Aguirre? Em entrevistas o Raí já reconheceu que talvez tenha sido o maior erro dele.

– Estava na Bombonera para a final entre Boca e River com a Conmebol e fui comunicado. O Raí assumiu sozinho a demissão do Aguirre, mas teve influência e pressão do universo São Paulo que queria apressar o processo do Jardine. Por isso falo que o São Paulo tem muita política e a pressão se multiplica. Havia um movimento quase geral no Morumbi para adiantar o processo do Jardine ser treinador.

– E na Barra Funda havia um certo descontentamento pela forma que o Diego, como qualquer técnico estrangeiro, trabalha, que é: as decisões tomo eu e minha comissão. Não consulto ninguém. As preleções são eu e os jogadores. Não permito a entrada de muita gente. Aqui no Brasil isso não está muito bem visto, e no São Paulo também não. Há uma cultura de muita gente participar na tomada de decisão, nas conversas, preleções e isso gerou um pequeno desgaste no CT com o Diego. Tudo ao contrário do que falam dos jogadores. Isso que fico um pouco chateado, porque os jogadores do São Paulo levaram culpa e não tem nada.

Muita gente falou do Nenê…

– A verdade é que se adoram. Tanto que trabalharam juntos no Catar, e Nenê depois manteve relação com ele. Há gestos públicos que não significam o que seja internamente. Então ficou um pouco marcado por isso. Os jogadores do São Paulo sofreram muita pressão por aquilo, e o Diego também foi um pouco injustiçado porque nada a ver. Tinha uma relação incrível com os jogadores. Alguns que não jogavam talvez esteja mais p…, como vai ser sempre.

– Mas foi isso: uma visão geral do clube, do processo do Jardine e esse pequeno mal-estar dentro do CT por Diego mudar a forma de trabalhar. Ele impunha as condições, horários, tomava decisões e talvez só consultava pessoal do futebol, que era Ricardo Rocha (então dirigente) e eu, que fomos os únicos dois que não fomos consultados na demissão dele. Nós dois entendíamos que era um erro na época.

Como recebeu a notícia da demissão do Aguirre?

– Com tranquilidade, aceitando e entendendo que, conhecendo a realidade do São Paulo, era um grande erro, principalmente porque se adiantava naquele momento o processo do Jardine, que era um técnico para talvez estar até hoje no São Paulo. Mas futebol tem timing, aquele elenco não era grande e bom como agora.

– Os meninos que Jardine com tanto êxito dirigiu na base estavam só subindo naquele momento. Precisavam de seis ou oito meses para se firmar. Mas foi um movimento geral do São Paulo, justamente por muita gente que gosta do clube, sente o clube, mas não tem a sensibilidade do vestiário. Na época fui contra, principalmente pelo erro que entendia que era para o São Paulo.

Foi um erro duplo, então: demitir o Aguirre e adiantar o processo do Jardine?

– Principalmente. E até depois por colocar a cruz nos jogadores que não tinham nada a ver, salvo Nenê que fez um gesto. Mas se adoravam. Colocaram a cruz neles e os jogadores que defendiam ele em campo. O mais importante são os jogadores. E talvez nunca se falou daquele descontentamento do CT pela maneira do Aguirre e de qualquer técnico estrangeiro de trabalhar. As decisões tomo eu e meu time. E consulto quem eu quiser consultar.

– Assim trabalham imagino Jesus no Flamengo, Coudet no Inter, Sampaoli. Mas nunca foi má intenção. Hoje, com o jornal de segunda-feira, é muito fácil falar. Falei na época, mas… e Raí, com muita valentia e honestidade, assume a responsabilidade, mas ele é uma energia da instituição naquele momento. Essa é a realidade.

De alguma maneira o Aguirre virou refém da própria expectativa criada pelo título?

– Sem dúvida. Vou repetir: em 2017 o São Paulo quase cai para a segunda divisão. No Paulista de 2018 ficou mais próximo de cair do que classificar. Elenco enfraquecido pela saída do Militão, machucou Rojas, Everton. Ninguém imaginava ficar 14 rodadas na liderança. O sonho era classificar na Libertadores. Acabou sendo refém daquilo e também na época havia um treinador muito promissor, que havia feito muita coisa boa e que hoje o São Paulo colhe os frutos do que Jardine fez na base. Porque depois o processo natural de um jogador evoluir e se solidificar estava ali.

Igor Gomes recebe faixa de capitão de Lugano — Foto: Divulgação São Paulo

Igor Gomes recebe faixa de capitão de Lugano — Foto: Divulgação São Paulo

Teve participações nas contratações de Cuca e Fernando Diniz?

– Cuca sim. Fui consultado. Cuca e Mancini participei realmente. Estava de acordo com ambas. Por mais que não tinha e nem sequer com Aguirre tinha muito diálogo, porque sempre fui muito chato com isso. Não gostava de ninguém interferindo no vestiário, com treinador e capitão. Acho que tem uma figura que tem de se comunicar com treinador e nesse caso é o Raí. E depois Raí escuta quem tem de escutar.

– Não tive muito diálogo com Vagner, Cuca e nem sequer Aguirre. Ele me consultava obviamente pela confiança, mas eu não procurava. Então, sim, participei em ambas: Cuca e Mancini. E na do Fernando não. Realmente não. Estava no Morumbi inaugurando um camarote quando escutei a decisão de ele ser contratado.

Estava no Morumbi quando Diniz foi contratado?

– Sim, inaugurando um camarote, fazendo minha função institucional. Nesses espaços que são muito bons. Soube por um conselheiro na época que estava inaugurando e me disse que Diniz foi contratado.

Tinha algum nome em mente na época ou achava que seria o Mancini?

– Não, achava realmente que o natural era o Mancini. Achava que era isso.

Surpreendeu a decisão?

– Sim, me surpreendeu.

O que você conhecia do trabalho do Diniz e qual era sua opinião dele?

– Conhecia do Brasil. Diferente na forma de jogar. Inovador. Às vezes um pouco arriscado, e sim conhecia muito bem. Treinador que tem um estilo próprio.

O Diniz fica de setembro de 2019 até o começo de 2021. Foi o técnico mais longevo da era Leco. Achava que ele era o nome certo para aquele momento?

– Na verdade, não participei. Sinto que a maneira de ver futebol é um pouco diferente. Vejo sempre futebol de uma maneira muito mais… é… enfim… maneira de jogar é taticamente equilibrada, mais consistente. Porém o fato de que muitos jogadores tenham pedido ele foi algo que…

Quais jogadores?

– Não sei quais. Mas sei que alguns pediram. Então como foi pedido e sei que muitas vezes jogadores têm uma opinião muito mais clara do que os dirigentes, então eu apoiei e tentei apoiar em todos momentos, mesmo sendo um futebol que é contra o meu estilo, a minha maneira de pensar. Minha. Sou muito particular também. Ninguém é dono da verdade. Mas o fato de muitos jogadores terem pedido ou opinado, eu não achei ruim, não. Até achei bom, porque isso envolve mais, dá mais sentido de pertencimento, responsabilidade, mostra que a turma está dentro do que está acontecendo.

– Então, mesmo sendo um futebol que não vejo hoje como ideal para o São Paulo, que tem que ganhar, vi com bons olhos que os jogadores se envolveram e não achei tão ruim, não, como muita gente achou. Até porque sempre fui líder e às vezes fui escutado, e toda história do futebol foi assim. Muitas vezes líderes participaram nesse tipo de decisões. E não está errado. Tem que saber quem são os líderes. E qual é a postura dos caras. Tem de ter essa sensibilidade.

Num primeiro momento você acha bom porque os jogadores pedem, embora não seja um estilo que te agrade. A partir de qual momento você discorda do futebol conduzido pelo Diniz?

– Não que discorde. Um cara 100% comprometido, passional, profissional, só que o São Paulo está na fila de coisas importantes. Nós, diretores, estamos com curto prazo para buscar um título. Nosso tempo estava vencendo. Nossa imagem e nosso prestígio dependiam muito de algum título. O São Paulo em 2020 acho que formou o melhor elenco da última década.

Fernando Diniz saiu do São Paulo no começo de 2021 — Foto: Marcos Ribolli

Fernando Diniz saiu do São Paulo no começo de 2021 — Foto: Marcos Ribolli

Na década o elenco de 2020 foi o melhor?

– Certeza. Desde que cheguei em 2015 até agora, certeza. Disparado.

Em 2014 foi vice-campeão do Brasileiro…

– Em 2016 fomos semifinalistas da Libertadores e olha o elenco que tínhamos. E olha o elenco que tínhamos. Infinitamente inferiores ao de agora. Infinitamente. Mas não é pouco, não. Elenco total, sim. Em qualidade e quantidade de jogadores: 2020 o São Paulo tem a melhor geração de Cotia. A melhor e mais numerosa talvez desde 2000 e pouco… é Antony, Helinho, Brenner, Luan, Diego Costa, Walce que machucou, Liziero, Sara, Perri… quem está faltando? A melhor e com mais jogadores de 20 anos prontos para jogar.

– Em 2018, quando viramos líderes, olhei o grupo e não tinha um jogador campeão. Falei: “C…, vai ser difícil”.No elenco tem o melhor goleiro do futebol mexicano nos últimos quatro anos, Volpi. Melhor dupla de zaga em números dos últimos dois Brasileirões, Bruno Alves e Arboleda. O lateral mais goleador e apoiador dos últimos Brasileirões: Reinaldo. Jogadores de meia idade que foram campeões em clubes anteriores: Tchê Tchê, Pablo e Vitor Bueno. Não esqueça de Pato, Anderson Martins, Luciano e Everton. Depois toda molecada multicampeã da base que este era o ano de estourarem. Jogadores multicampeões como Daniel Alves, Juanfran, Profeta (Hernanes) um líder nato. Time equilibrado como nunca.

– Pelo menos desde que cheguei em 2016 disparado. E pelo que estudei para trás, também. Então achava que era o momento de ganhar nesse último ano. Simplesmente isso. Achava que a maneira de ganhar, o caminho mais curto era algo mais à maneira como vejo futebol.

– O mistério, e que não conseguimos descobrir o déficit, é porque no São Paulo nos últimos anos os jogadores diminuem e não explodem. A diferença para minha época é que até um meia-boca como eu vestia a camisa do São Paulo e explodia na carreira.

Em que momento expõe essa discordância de ponto de vista?

– Não, ponto de vista sempre. Até porque era um pouco da minha função: ser equilíbrio entre duas opiniões opostas ou diferentes. Tem de se achar o ponto intermediário. Foi minha função. Mas obviamente à medida que o tempo encurtava e a urgência de ganhar era maior, na minha maneira de ver não achava como a gente ser consistente em jogos importantes mata-mata ou decisivos com aquela forma de jogar. Não achava, sinceramente.

– Foi o que tentei fazer entender a direção, que tinha de mudar a forma de jogar, para tentar aproveitar esse elenco para obter títulos ainda nesse ano antes de sair. Simplesmente isso, com todo respeito ao treinador, à tomada de decisão. São formas de ver futebol e era minha obrigação por estar lá falar o que achava e pensava. Nada mais do que isso. Nem mais ou menos. Não teve briga. Ponto de vista. Forma de ver futebol. Minha visão era outra e fim. Por hierarquia, se fosse por mim, realmente teria mudança, mas…

Quando fala em mudar a forma de jogar é mudar o treinador.

– Muda forma de jogar e mudar treinador. Falei internamente. Até porque o treinador não mudava a forma de jogar.

E quando você conversou com o Diniz sobre achar que hora de mudar?

– Em algum momento com muito respeito conversei. Entendia que meu vínculo era o Raí, mas um pouco por lealdade, por ser honesto, algum vez conversei com ele sobre isso.

Que era hora dele sair?

– Não, que era hora de mudar o estilo de jogar. Só isso. Nem briga, nem discussão. Pontos de vista de futebol diferentes.

O que ele falou?

– Não, ele disse que entendia que daquela maneira iria ganhar. Eu entendia que daquele jeito não via como ganhar. Simplesmente isso.

Você falou pra ele depois da eliminação do Mirassol que seria melhor trocar de treinador?

– Na conversa com ele falamos de futebol. Briga não teve. Depois com Raí falei também meu ponto de vista. Restavam quatro títulos. Sinceramente achava que daquela maneira seria difícil conquistar alguma coisa, e que o tempo para ele e para mim, que éramos os que tinham prestígio pra defender e perder, que estava acabando, e que necessitava algo para ganhar ao menos um título. Ou seja, aproveitar esse grande elenco que o Raí formou esse ano, que pra mim é um grande elenco. Não sei por que vocês querem depreciar. É um grande elenco. Completo. Depois do Flamengo é o melhor do Brasil. Certeza.

Kaká conversa com Lugano, Pássaro e Raí no Sã Paulo — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net

Kaká conversa com Lugano, Pássaro e Raí no Sã Paulo — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net

O elenco do São Paulo é o melhor do Brasil depois do Flamengo?

– Falei em janeiro de 2020. O mesmo que falei lá falo agora. Certeza. O time ficou em primeiro, mas acabou não conquistando.

Na época em que o Menon publicou no UOL sobre a sua conversa com Diniz depois do Paulistão tentei checar a história e ouvi de pessoas ligadas ao Diniz o questionamento de por qual motivo você não havia falado que não concordava antes da eliminação quando estava tudo bem.

– Falei desde o começo para o Raí. Desde o começo. Claro. Porém, no futebol ninguém é dono da verdade. Agora, falar para o Diniz, sim. Antes achava mesmo que era bom provar, testar. No futebol não tem verdade absoluta. Mas antes de falar para alguém sobre o treinador, era melhor para falar com o treinador. Acho que para ganhar tem que trocar. Simples assim.

E o Diniz respondeu…

– Muito convencido da ideia dele. Um cara muito legal, muito obcecado. Bonito de ver como defende a ideia dele. Mas estava na obrigação de colocar meu ponto de vista, porque estava meu prestígio e o do Raí em jogo. Éramos os que tinham prestígio a perder. E perdemos, aliás.

No primeiro semestre você era muito ativo, inclusive nas redes sociais, e depois sumiu no segundo semestre. Por quê?

– Simplesmente por isso. Se não estou de acordo com algo, não vou ficar todos os dias martelando sobre algo. Não posso ser uma influencia negativa. Se você não está de acordo, acha que não está bem, deixa as coisas rolarem. Não vou ser um peso. Vim para o Morumbi continuar com meu trabalho institucional, torcer pelo time, sem estar toda hora sendo chato falando as mesmas coisas. Simples assim.

Você acha que sai arranhado do São Paulo?

– Acho que como diretor estar três anos e não conseguir um título você sai um pouco arranhado de um time como o São Paulo. Óbvio. Mas sempre com a consciência tranquila de ter feito o melhor e ter aprendido muito, de sempre ser honesto, colocar meu ponto de vista, sem impor, ajudando, colaborando, sendo leal a todos, e como fiz como jogador às vezes ser o cara que opinava um pouco diferente, fora da lógica. Às vezes dá um equilíbrio. Às vezes é chato e às vezes dá um equilíbrio. Depende de como se utiliza.

Kevin Thelwell, à época diretor do Wolverhampton, em conversa com Lugano, do São Paulo, em seminário do TransferRoom em Madri — Foto: Divulgação/TransferRoom

Kevin Thelwell, à época diretor do Wolverhampton, em conversa com Lugano, do São Paulo, em seminário do TransferRoom em Madri — Foto: Divulgação/TransferRoom

Como você enxergou esse outro lado dos bastidores?

– Muito maior e mais complexo do que imaginava. Muita gente capaz no Morumbi, marketing, finanças, institucional, clube, social, contratual, e tudo depende da bola entrar ou não entrar. O Leco mudou estatuto, fez coisas muito boas, mas se a bola não entra tudo está mal. É complexo pra c…. Muita gente participando e fazendo coisas boas para o clube em várias áreas, e quando a bola não entrava, parecia que tudo estava mal. Então o vestiário, onde eu mandava, talvez fosse mais importante.

Você falou do Leco. Entrou com promessa de diminuir a dívida, mas aumentou e saiu sem títulos, com os resultados que o São Paulo teve. Alguns acham que ele é um dos piores ou o pior presidente da história. O que você acha?

– Sinceramente acho que é um exagero da época das redes sociais, do imediatismo. Convivi e vi o presidente tentar fazer muita coisa boa. Mudou estatuto do clube, deixou muito mais moderno. Isso pouca gente faz. Tem profissionais trabalhando em muitas áreas melhorando: Morumbi, institucional, social, deu muita liberdade ao Raí no futebol para fazer o melhor possível. Formou grandes times. O elenco de 2020 foi muito bom. Claro, não teve a sorte de ser campeão. Futebol no fim das contas é isso. A bola entrar ou não.

– Mas é um exagero e um produto da era das redes sociais. Futebol tem de ganhar. Na minha antiga passagem como jogador, quando ganhava tudo, vi erros no clube que se cometo hoje sou pendurado no Morumbi. Então o segredo é ganhar ou não ganhar. Tem que ser correto e falar o que penso. Mesmo que não tenha muito diálogo com o presidente, sou um cara muito antigo e grato. Mas o correto é correto. Faltou ser campeão. Que não é detalhe, mas cada dia no futebol é mais difícil.

Se fosse o novo presidente, você demitiria o Lugano diretor?

– Sim, 100% porque tem que mudar. Entrar gente nova, com energia nova, ideias novas. Ou as mesmas ideias e energia renovada. Tudo tem um tempo, um ciclo. O futebol desgasta muito. O São Paulo desgasta muito. Tem que mudar. Presidente atual fez muito certo em tirar eu e a estrutura do futebol, mas tem muita gente valiosa e com patrimônio de experiência no CT para conservar. E tem que dar certo, não é possível. O São Paulo tem cometido erro, mas também tem muito acerto. Uma hora a bola tem que entrar. Sai campeão e aí muda a energia.

O que achou da contratação do Crespo?

– Gosto do perfil. É um cara que jogou com os melhores jogadores, técnicos, esteve nos melhores vestiários e viveu as melhores sensações. Isso traz uma vantagem indiscutível. Obviamente não quer dizer que é um grande treinador, mas quem viveu isso tem mais vantagem. Indiscutível. Ganhou de cara com o Defensa y Justicia. É um cara promissor, bom carisma, positivo, instruído, acho que combina com São Paulo.

– Além de tudo, tomara que dê certo, aproveite o elenco do São Paulo. Falo o mesmo há uns três ou quatro anos, mas o São Paulo está “a nada” de virar a chavinha. Torcedor fala: “Pô, há três anos você fala o mesmo”. Mas estamos a nada de ganhar um Paulista, um torneio menor e o São Paulo volta a ser monstro de novo. Estamos aí: 2018, 2020 final do Paulista, semifinal da Libertadores (2016). Falta tirar esse peso de cima. Tomara que consiga isso.

Lugano e Rogério Ceni São Paulo de 2017 — Foto: Marcos Ribolli

Lugano e Rogério Ceni São Paulo de 2017 — Foto: Marcos Ribolli

O Rogério Ceni vai voltar a ser técnico do São Paulo?

– Já falei quando saiu do São Paulo há três anos. Vai voltar amanhã, ano que vem, dois anos e vai ser campeão no São Paulo. Sem dúvida. Vai ser assim. Vai voltar e será campeão. O cara não é normal. A dedicação, obsessão… O São Paulo e ele sempre estarão ligados. Obviamente ele tem vida fora do São Paulo, legal para ele como pessoa, tanto como profissional. Fico feliz em ver ele competindo com outro grande do Brasil, o Flamengo, uma hora ou outra vai voltar ao São Paulo. Não há dúvida. Está escrito. Quem entende de sensibilidade de futebol sabe.

Alguns torcedores do São Paulo se sentiram traídos com a ida do Rogério ao Flamengo. O que pensa disso? (Nota da redação: a entrevista foi feita antes das declarações de Rogério Ceni ao Esporte Espetacular, que também repercutiram entre torcedores são-paulinos).

– Me senti triste pela reação de torcedores com ele, porque na hora que vira profissional ele muitas vezes não escolhe o timing dos técnicos (o “timing” a que se refere Lugano é do Flamengo ter contratado Ceni na véspera do duelo com o São Paulo pela Copa do Brasil) e sim os tempos escolhem o profissional. Acontece com todos nós. Tem que ter entendimento do que significa ser profissional do futebol, que não quer dizer não ter sentimentos, com respeito a figura profissional. Mas no fim é coisa da paixão, paixão é sempre irracional. E dura pouco. Falou traição? Nada a ver. Depois todo mundo reavalia e diz: “Porra, ele fez o que o caminho indicou a ele”. Tenho certeza que hoje (a entrevista foi feita no dia 18 de fevereiro) 100% da torcida do São Paulo pensa igual. Assim é a vida do profissional no futebol.

Como acha que o Raí sai do São Paulo? Menor?

– Raí foi corajoso pra c… de assumir essa responsabilidade. Acho que sai maior ainda. Tive a sorte de conhecer pessoalmente. Como jogador f…, como pessoa fora da curva do futebol. Difícil o São Paulo ter um cara como ele, pela honestidade, intenção de fazer o bem. Não foi campeão, mas eu como jogador, em 2016 e 2017, ficamos na segunda parte da tabela. Em 18, 19 e 20 o São Paulo esteve para ser campeão, faltou pouco para sair absoluto. Em 2020 volto a repetir: pra mim formou o melhor elenco da década, de ponta a ponta, não só jogadores. Elenco. E o mais importante é que no futebol não se controla o resultado, mas a postura, sim. Ele mostrou classe, em momentos positivos, negativos, de pressão. Uma classe típica de um fora de série.

O Hernanes saiu de protagonista em 2017 para um coadjuvante em 2020. É um ídolo. Como ele se sente e como acha que deveria ser conduzido daqui para frente?

– Primeiro que a presença do Profeta no São Paulo, no vestiário, na instituição, traz a garantia pra todos nós são-paulinos de um cara 100% torcedor, íntegro, profissional, ganhador. A presença dele no São Paulo é indiscutível. Obviamente o tempo passa e você perde protagonismo. Tem que assimilar aos poucos. Acho que o Profeta é um cara muito competitivo. Não só por ser ídolo, jogar e ser protagonista. Realmente eu sinto que há muito respeito com ele da torcida e imprensa. Vejo que tem capacidade para ajudar muito em campo, é decisivo.

– Mas aconteça o que for tem de respeitar muito ele, porque é ganhador. Uma lenda ali dentro. Um cara impecável. Impecável. O São Paulo se caracteriza por realmente respeitar os ídolos, todos nós chegamos em um momento em que o físico cai, a bola não chega, você fica mais lento, e acho que o Profeta tem que tomar a decisão: se quer estar aqui, se vai sair. Acho que o São Paulo não deveria forçar nada e sim deixar ele, uma pessoa impecável, tomar a decisão que achar melhor pra ele. E acho que o São Paulo vai fazer. Nesse sentido o São Paulo é diferente. Respeita o ídolo e a história. E o Profeta representa a todos no clube.

Lugano, Leco e Daniel Alves na apresentação no São Paulo — Foto: Marcos Ribolli

Lugano, Leco e Daniel Alves na apresentação no São Paulo — Foto: Marcos Ribolli

Qual foi sua participação na contratação do Daniel Alves?

– Fui no vestiário do Paris em um jogo do Francês e falei que tinha de vestir a camisa do São Paulo. Essa é a realidade. Disse que se era f… mesmo que tinha que ir ao Brasil e ser campeão com a gente, que seria o maior desafio da carreira dele. No vestiário do Paris: estava Buffon, Verrati, Marquinhos, Thiago Silva. Depois foi o melhor jogador da Copa América, capitão do Brasil campeão, deu a palavra e veio aqui.

O que acha dele?

– F… jogadoraço, líder, exótico, excêntrico, diferente em tudo que faz e fala. Como sempre quando ganha isso joga a favor, e quando não ganha joga contra. Mas não mudou nada do que era na Europa. Mesmo cara. No melhor momento do São Paulo foi exuberante o que jogou. Exuberante. No momento ruim, por ser a referência, a responsabilidade cai em cima.

Acha que ele foi mal escalado taticamente? Haveria uma forma de aproveitá-lo melhor?

– A gente trouxe o Daniel Alves pensando em usar pela qualidade técnica, tática e ofensiva. Não trouxemos ele pra marcar os pontas do Brasil. No meu ideal ele jogaria na segunda linha pela direita, como jogou no Paris, na Juventus, no Barça, no Brasil campeão da América de Dunga, em 2007 contra nós (Uruguai): sempre na segunda linha pela direita, aportando chegada ao fundo, qualidade, dinâmica, toque. Talvez não tanto pelo meio. Na minha maneira de pensar, pensava ele na segunda linha pela direita. Volante pela direita. Como jogou sempre.

Entre o que você esperava e o que o Gonzalo Carneiro rendeu qual foi sua avaliação? Imagino que você tenha indicado a contratação…

– Foi 100% minha responsabilidade. Sem dúvida. Um jogador de 1,97m, tem os melhores testes físicos do elenco do São Paulo. É o mais rápido, o que pula mais alto do elenco, com 1,97m, e joga de meia, 10, tem uma canhota incrível. Todo mundo sabe do potencial dele, menos ele. No treino ele atropela todo mundo, por isso jogou com Aguirre. Quando Mancini chegou colocou, Cuca colocou na semifinal (Paulistão 2019). Agora Vizolli coloca. Todo mundo vê nele um atleta… no Uruguai já era uma promessa. Já falei com ele muitas vezes. Ele é introvertido até comigo.

– Ele tem um problema muito grande de ser introvertido. Não fala com treinador, imprensa, diretor, só com companheiros. Tudo ao contrário do que o jogador moderno tem que fazer: tem que se vender para torcida, falar com imprensa e puxar saco do treinador. Então é um cara tudo ao contrário: introvertido a todo contexto, menos com companheiros. Tem uma condição física diferenciada, mas sinceramente, já falei pra ele, não correspondeu nem 1% da expectativa que tem no Uruguai nele. Com potencial que tem seria substituto natural de Cavani e Suarez (na seleção). No Uruguai se via assim indubitavelmente. Aliás, fisicamente é melhor que os dois.

E aí ele foi pego no doping por cocaína. Como foi pra você?

– Foi um jogador que para os padrões do São Paulo não era muito caro. Uma promessa do futebol uruguaio. Uma aposta. Tinha ganhado um título quase sozinho com o Defensor (no Uruguai), mas já apresentava alguns problemas de relacionamento e por isso o custo barato e a intenção de o São Paulo explorar. Com condições físicas para um atacante, de 1,97m de altura e a velocidade dele difícil de ver. Mas depois está tudo na mentalidade e até onde o jogador quer chegar.

– A vida extracampo obviamente atrapalha muito tantos jogadores da história do futebol, nesse caso Gonzalo teve um problema sério. Além de tudo, da decepção e tudo o que isso trouxe de ruim pra ele e pro São Paulo, tomara que supere aquele momento como pessoa, aquela depressão que sofreu, e que algum dia entenda o potencial físico pra poder atingir no futebol o que realmente pode atingir.

O que você pretende fazer da vida agora? Pensa em um dia voltar ao São Paulo? Nota da redação: Lugano foi anunciado como comentarista da ESPN / FOX no início de março.

– Primeiro desintoxicar do futebol. Nunca parei. Há 20 anos não paro. Desintoxicando da pressão. Estava necessitando eu e minha família. Curtir um pouquinho da vida, depois me ocupar de coisas pessoais. Estava deixando muita coisa pra trás. Isso é fundamental. Ter tempo para minhas coisas. E também aproveitar daqui a pouco para me instruir e capacitar mais, tocar meus projetos fora do futebol e aproveitar esse tempo para me capacitar, seguir ativo na federação uruguaia. Sou presidente da associação de jogadores uruguaios, que tem 20% dos votos dentro do congresso uruguaio. Então temos incidência em tudo o que acontece no Uruguai.

– Tenho pensado em me instruir teoricamente mais no futebol, terminar minha pós-graduação de técnico. Tenho a B e vou terminar a A. Não é uma pretensão (ser técnico). Terminar um curso de Uefa sobre direção esportiva para ter também. E aprender teoricamente o que a prática nos anos me ensinaram só pra me manter atualizado. Dedicar mais tempo a minha pessoa e menos a instituições. Hoje não penso em voltar. Estou saturado. Só sei que fiz um curso prático e intensivo de como funciona esse universo, de erros e acertos, de como se dirige, curso intensivo muito bom. Agradeço muito a quem me deu a oportunidade e peço desculpas para a torcida por não trazer os resultados que tive como jogador.

Lugano comemora título Mundial do São Paulo sobre o Liverpool, em 2005 — Foto: Arquivo Histórico do São Paulo FC

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Fonte: GE – Globo Esporte.

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