Redação Publicado em 18/03/2020, às 00h00 - Atualizado às 20h30
Na política, é fundamental prever cenários e planejar ações para cada um deles. No entanto, mesmo com muita capacidade de observação, existe sempre o imponderável. Alguns menores, controláveis com uma simples gestão competente de crise, e outros grandes, enormes, capazes de transformar a História. Este é o caso do novo coronavírus.
Para quem acha que é um exagero, dê uma olhada nos ambientes em que a pandemia já passou ou está em estágio mais avançado. Além de causar desastres econômicos e diversas mortes, há resultados políticos. Na China, ela modificou estruturas importantes do Partido Comunista e da gestão da saúde pública. E isso foi apenas o começo.
A forma como cada gestor público encara o problema será escrita como parte fundamental das biografias e da capacidade de manutenção dos projetos de poder. Na Itália, na França e em toda a Europa, os líderes sabem disso e estão se mexendo. Com exceção de Boris Johnson, primeiro-ministro do Reino Unido, que preferiu não levar a sério no primeiro momento, todos os outros estão trabalhando para conquistar uma narrativa louvável durante a crise. Em Portugal, a ministra da Saúde está sendo questionada por sua capacidade e, com certeza, não sobreviverá politicamente.
Nos EUA, num primeiro momento, o presidente Donald Trump preferiu fazer coro com os teóricos da conspiração, dizendo que nada era tão grave, seria tudo invenção da imprensa. Como as coisas pareceram sair do controle, voltou atrás, mas sabe que será cobrado nas eleições de outubro sobre a performance arriscada. Do lado democrata, o coronavírus pode ser uma das maneiras de levar Bernie Sanders à dianteira das primárias novamente. Com discurso ligado ao acesso gratuito aos planos de saúde, essa pode ser uma virada importante. Joe Biden já notou isso e vem incluindo o tema na comunicação da campanha.
Por aqui, o presidente Jair Bolsonaro fez uma escolha perigosa. Afinal, ao desrespeitar o próprio governo, inclusive o Ministério da Saúde, ele coloca em risco o apoio das estruturas burocráticas, dos demais poderes e da população. Se a pandemia resultar em muitas mortes, com certeza, a conta para ele será bem alta. E, pelo jeito, antigos apoiadores, como o governador de Goiás Ronaldo Caiado, não arriscará as próprias trajetórias para se juntar ao presidente.
As próximas semanas têm muito a contar sobre o nosso futuro.
Kleber Carrilho é professor, analista político e doutor em Comunicação Social
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