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Fininho avalia pressão nos jovens do Corinthians e diz que sonhava com chance após gesto obsceno

Apostar em jogadores da base, como tem acontecido em 2021, não é uma novidade no Corinthians.

Corinthians
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Redação Publicado em 09/04/2021, às 00h00 - Atualizado às 16h17


Ex-lateral lembra as consequências da noite em que mostrou os dedos médios para torcedores no Pacaembu há 16 anos: “Foi uma atitude isolada”

Apostar em jogadores da base, como tem acontecido em 2021, não é uma novidade no Corinthians.

Em vários momentos diferentes da história, meninos transitaram entre a base e o profissional e escreveram suas histórias. A pressão sempre foi grande. E nem todos lidam da mesma forma.

Há 16 anos, o lateral-esquerdo Vinícius “Fininho” explodiu. Num jogo no Pacaembu diante do Sampaio Corrêa, pela Copa do Brasil de 2005, foi substituído por Coelho quando o Timão vencia por 1 a 0 e respondeu às críticas mostrando os dedos médios a alguns torcedores. O jogo acabou 3 a 0. Ele tinha 21 anos.

Fininho foi expulso, multado e afastado por dois meses pelo técnico Tite, pelo gerente Paulo Angioni e pelos diretores da MSI, fundo de investimentos que geria o clube naquele momento.

Fininho mostra dedos médios para a torcida do Corinthians — Foto: Reprodução

Fininho mostra dedos médios para a torcida do Corinthians — Foto: Reprodução

Com 12 de anos de clube e no elenco profissional entre 2003 e 2006, o ex-jogador de 38 anos diz hoje acreditar que não suportou à pressão.

Ele até chegou a jogar mais três vezes naquele mesmo ano e fez mais cinco partidas em 2006, totalizando suas 48 pelo clube, mas o ambiente nunca mais foi o mesmo.

Em 2006, foi vendido para o Lokomotiv Moscou, da Rússia, passando nove anos na Europa até se aposentar em 2014, aos 29 anos, em razão de problemas na cartilagem do joelho.

– Essa questão foi bem momentânea. Não estava fazendo minha melhor partida, e quando você é jovem age mais com impulso, mais com a emoção do que com a razão. E acabei fazendo aquele gesto que infelizmente marcou minha carreira. Mas os erros servem para você aprender. Aquilo me tornou grande, errei, tive que lidar com a pressão – contou ele, nesta entrevista ao ge.

Hoje coordenador técnico da base do Clube Atlético Joseense, de São José dos Campos, Fininho passou a história a limpo e revelou que guardou com ele a chance de dar a volta por cima no Timão:

ge: Primeiro vamos lembrar o contexto. Quem era a sua geração de jovens da base?

– Era eu, Rosinei, Betão, os goleiros Marcelo e Tiago, Bruno Octávio. Eu cheguei no Corinthians em 1994, passei por todas as categorias, e em 2002 eu já fazia transição para o profissional, peguei grandes astros, Rincón, Marcelinho Carioca. Mas aí saíram vários talentos, era uma transição financeira como hoje. Começou a entrar muito jogador da base e foi quando nossa geração subiu, era um período difícil até achar esse equilíbrio. E aí veio a MSI em 2005, que financeiramente estruturou o clube, trouxe Roger, Tevez, Gustavo Nery, outros argentinos, Carlos Alberto, enfim, ali realmente o time remodelou.

ge: Qual o tamanho da pressão de um menino da base no profissional do Corinthians?

Fininho: –Quando se fala de Corinthians, não dá para falar que não existe pressão. É pressão o tempo todo, o clube do povo. Eu, como era da base no clube, sabia que era grande. Mas saindo você vê realmente o tamanho. É uma pressão interna e externa. Fico muito feliz de ver esses meninos hoje tendo a oportunidade pela questão financeira que o clube vive, isso também aconteceu na nossa época. Tinham grandes jogadores em 2001, 2002, aí 2003 ficou difícil manter o processo, saíram de uma vez muitos jogadores. Do lado esquerdo foi a maior bomba. O Kleber é meu amigo, mas eu brinco: “Era você, Gil e Ricardinho. Todo mundo saiu e vai lá o Fininho jogar na lateral”. Eu novo ali, preparado, mas despreparado, base é uma coisa e profissional é outra, você acaba sentindo um pouco da pressão, eu vi que o negócio era pesado mesmo. Corinthians é pressão.

Qual a sua avaliação sobre esse episódio hoje, aos 38 anos?

– Só o tempo para mostrar as coisas. E ele realmente mostra, você vai entendendo. Eu era um menino, hoje me sinto bem confortável para falar deste assunto. E sempre gosto de esclarecer: quando a galera fala, dá a impressão que eu era odiado dentro do clube. Muito pelo contrário. Eu vinha desta transição, subi em 2003, o episódio aconteceu em 2005, eu vinha de dois anos no profissional, de joga, não joga, sempre ali fazendo bons jogos, o pessoal sempre gostou de mim. E essa questão que aconteceu contra o Sampaio Corrêa foi bem momentânea. Não estava fazendo minha melhor partida, e quando você é jovem age mais com impulso, mais com a emoção do que com a razão. E acabei fazendo aquele gesto que infelizmente marcou minha carreira. Mas os erros servem para você aprender. Aquilo me tornou grande, errei, tive que lidar com a pressão.

– Tive um ciclo feliz. Fui campeão da Copinha, indiretamente participei do título do Paulistão (de 2003), em 2005 estava no elenco do Brasileiro, mas acabei saindo devido a esse episódio. E precisava ganhar o mundo, ter outros desafios, joguei em cinco clubes no Brasil, fui campeão no Figueirense, fui vendido para a Europa, então eu devo tudo ao Corinthians. Eu frequento o clube, sempre que posso estou lá. Teve a polêmica e com ela amadureci. Só tenho a agradecer ao clube. O Corinthians é pressão.

Fininho, ex-Corinthians, coordena a base do Joseense — Foto: Arquivo pessoal

Fininho, ex-Corinthians, coordena a base do Joseense — Foto: Arquivo pessoal

O técnico em 2005 era o Tite, que depois voltaria ao Timão. Como ele reagiu?

– É legal falar dos bastidores agora. Era o Tite, ele vinha num processo de afirmação, já tinha rodado, já tinha seu nome. Aprendi muito com ele, sempre motivador. Quando teve o episódio do dedo, internamente a gente sabia que o clube vivia a pressão por resultados e ia sobrar par alguém. Naquele dia sobrou para mim. Eu não era um jogador odiado. Depois a gente teve uma conversa, o Paulo Angioni era o diretor, o Andrés Sanchez também era, fui bem acolhido. Óbvio que não foi uma coisa positiva, mas todo mundo viu que o momento não era bacana. Fui afastado, não tinha nem como não ser. Fiquei treinando com o grupo, aí o Tite acabou saindo. Veio o Daniel Passarella.

– Eu era dedicado, ele estava chegando, me botou para jogar de novo. Eu consegui superar, ganhei uma nova oportunidade, mas depois saí. Confesso que fiquei com um gostinho de uma possibilidade de volta depois, quando já era mais velho. Eu tinha muito tempo de Europa, jogado Liga Europa, Liga dos Campeões, me sentia preparado para uma nova chance. Eu sonhava, como foi com o Fagner.

Acha que o episódio do dedo do meio te impediu disso?

– Atrapalhou, não tem como não atrapalhar, você fica marcado. Vocês estão me dando oportunidade de até esclarecer uma coisa de muito tempo atrás. Para não ficar “Fininho, o do gesto obsceno”, mas eu tenho uma história bonita no clube, participei de muita coisa, fui feliz no Corinthians, fiquei 12 anos lá. A questão da volta me atrapalharia, mas era meu objetivo. Sonhar é possível, pensava em voltar e dar uma volta por cima com um título.

Mas sendo específico, em que momento da sua carreira você achou que poderia voltar?

– Foram quatro anos no Lokomotiv de Moscou, que era uma potência, lá tive chance de jogar a Liga dos Campeões, depois fui para o Metalist da Ucrânia. Lá, quando eu tinha 27 anos eu pensava, sim, tinha números, justificava uma volta. Eu tinha mostrado na minha carreira que aquilo tinha sido um acaso. Se eu fosse mau jogador, não teria chances. Passei pelo Juventude, fui campeão catarinense no Figueirense, estive na Rússia e fiquei estável na Ucrânia. Nunca falei isso, mas de coração, quando tinha 27 anos eu estava numa idade boa para voltar. Depois parei aos 29.

Fininho com Willian Bigode no Metalist, da Ucrânia — Foto: Arquivo pessoal

Fininho com Willian Bigode no Metalist, da Ucrânia — Foto: Arquivo pessoal

Chegou a falar com seus empresários sobre essa meta?

– Ficou guardado comigo e com alguns amigos. Trabalhei com a Traffic por sete anos. Mas eu não falava para eles. Eu tinha mercado na Europa, então falava para os familiares. A real é que eu tinha esse desejo, pois até hoje…Eu estou ficando mais velho, já mudei para caramba, estou calvo, não tenho mais aquela cabeleira. Aí perguntam: “Lembra dele? É o Fininho. Aquele da torcida”. Todo mundo fala do gesto, menos da minha carreira. Então eu pensava em voltar para quem sabe apagar um pouco do que carrego comigo. E considero uma injustiça. Foi uma atitude isolada, não foram vários atos, mas a gente sabe que o brasileiro é assim, você carrega o fardo. E não tenho problema, eu cresci muito com isso, fiquei blindado. Quando aconteceu, eu falei: “Não vai ter como, vou ter que cair para o mundo”. Deixei de ser criança para virar homem. Foi uma atitude errada que me fez sair do colo do pai, o Corinthians.

Em 2014, o clube fez um grande evento de inauguração da Arena Corinthians e você foi retirado da lista de última hora depois da repercussão que deu ao noticiarem que você jogaria…

– Vou te contar uma coisa que aconteceu. Quando teve o fato, eu frequentava muito a quadra (da Gaviões da Fiel), sempre gostei de Carnaval, minha família é do Carnaval. Na época era o Metaleiro o presidente, tinha o Macalé, um cara que sou amigo até hoje. No outro dia foram lá conversar comigo. Eu não fiz o gesto para a Gaviões, era para meia dúzia da arquibancada, mas o negócio inflamou. E me falaram: “A gente adora você, a gente tem você como filho, a gente conhece sua luta, mas você não sabe o tamanho deste clube. Isso te prejudicou e vai te prejudicar muito na sua vida. Da nossa parte tá ok, a gente te conhece. Mas você vai ver o tamanho do clube”. Eu fiquei olhando para eles, pedi desculpas, me abraçaram, falaram que não tinham como me ajudar. Isso ficou na minha cabeça.

– Aí trago para 2014. O negócio é tão grande que chega em 2014, nove anos depois, me ligam para falar que eu estava selecionado para participar da inauguração, aí saiu uma matéria e disseram que eu não poderia mais participar por aquela questão. Vou ter de carregar isso para o resto da minha vida (risos). Muitos amigos foram, eu queria muito ter ido, mas acho que se eu fosse eu ia estragar o dia lá.

Mas a ligação com o clube seguiu, né?

– Vira e mexe eu ia jogar no master (antes da pandemia). Sou novo, mas já joguei com Neto, Zenon, Biro Biro, Marcelinho Carioca, Dinei, Ezequiel, Ronaldo Giovanelli, Nilson, Geraldão, todos esses caras eu joguei no master. Sou um privilegiado, sou Corinthians de verdade, joguei em todas as gerações (risos).

Essa molecada de 2021 está começando a jogar em estádios sem torcedores por conta da pandemia; Acha que isso pode tornar esse processo mais fácil?

– Eles vão jogar muito mais leves. Mesmo sendo meninos que estão de jovem no clube, por mais que já tenham jogado com torcida na base, nada se compara a um jogo no profissional. Um clássico, um Corinthians x São Paulo na Arena ou no Morumbi. Não vou dizer que vão sentir, mas tudo depende de como forem em campo. Se estiverem indo mal, com torcida isso reflete muito mais. Sem torcida fica mais leve, sim, vai ter uma pressão interna do treinador que fica na orelha, mas o rendimento deles vai ser melhor. Tudo é adaptação quando você sai da base. Você sente a torcida. Eles vão se beneficiar e precisam aproveitar. Não tem que ter medo, mas a pressão é diferente, sim.

Tem algum conselho para esses meninos que estão iniciando as suas trajetórias no Corinthians?

– De repente, pelo fato ocorrido, um conselho meu não sei se seria de boa valia (risos), mas é aproveitar a oportunidade. Eu sei o caminho que eles trilharam para chegar ao profissional. São meninos do terrão, como eu fui, e sei que a disputa foi árdua para chegar no nível de ter uma chance no profissional. Eles são privilegiados. Que joguem com coragem, como estão fazendo. Tenham personalidade, saibam lidar com a pressão. Hoje os meninos são melhor orientados que eu fui, hoje eles são mais blindados. Então que aproveitem, poucos têm a oportunidade de jogar no Corinthians.

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Fonte: GE – Globo Esporte.

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