Se havia dúvida em relação ao ambiente que marcará o ambiente político brasileiro de agora até a próxima eleição para presidente da República, ela se dissipou na noite de sexta-feira passada, quando a Câmara dos Deputados manteve a prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ). Decretada pelo ministro Alexandre de Moraes e confirmada pelo plenário do STF, a legalidade da medida vem sendo despertando paixões de um lado e do outro desde o primeiro momento.

A decisão da Câmara aumentará a temperatura no cenário político e o clima permanecerá quente até que as urnas de 2022 sejam abertas e os votos, apurados. Mesmo sem qualquer intenção de discutir o mérito da decisão e deixando os aspectos jurídicos para os especialistas em direito, todo cuidado é pouco para analisar a decisão. Em primeiro lugar, é preciso separar o fato de suas possíveis consequências.

O fato, como se sabe, é o vídeo deplorável que Silveira gravou com ofensas e ameaças ao STF — e que motivou sua prisão e exigiu um posicionamento de seus colegas deputados. As consequências ainda estão por vir.

O boi e a boiada

A folga no placar pode dar a sensação ilusória de que o assunto foi encerrado com a votação de sexta-feira. Entre os 513 deputados que compõem a Câmara, houve 364 votos a favor da prisão. Houve, também, 130 votos contrários, três abstenções e 16 omissões. À primeira vista, foi uma vitória acachapante dos que criticam o estilo truculento e o discurso inflamado do grupo mais extremado de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro. A verdade, no entanto, é que a história está apenas começando e ainda vai dar muito o que falar.

Ao aprovar a decisão do STF sem qualquer tipo de ressalva, os parlamentares, na prática, abriram a porteira para que a Justiça mantenha ou até mesmo aumente o controle que tenta exercer obre o legislativo. Afinal, já ensinava o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, pela porteira que passa um boi, passa uma boiada…

Quanto mais o Legislativo delegar ao Judiciário poder para tomar decisões que repercutem no cenário político, mais os juízes se sentirão à vontade para limitar a atuação política tipificada pela Constituição e pelas leis. Nesse cenário, é de se prever que as eleições de 2022 serão, talvez, as mais judicializadas da história — e quanto maior for a intervenção no processo, menor será a autonomia do eleitor para escolher seus governantes e seus representantes no legislativo. A primeira consequência política da decisão de sexta-feira, portanto, será a redução da autonomia do parlamento.

por ig