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Após denúncia de garimpo ilegal de chumbo, moradores são vistos em terreno contaminado de antiga fábrica de baterias

Após a denúncia do garimpo ilegal de chumbo que funciona na área de uma antiga fábrica de baterias, em Sorocaba (SP), moradores foram vistos no terreno na

Após denúncia de garimpo ilegal de chumbo, moradores são vistos em terreno contaminado de antiga fábrica de baterias
Após denúncia de garimpo ilegal de chumbo, moradores são vistos em terreno contaminado de antiga fábrica de baterias

Redação Publicado em 20/08/2018, às 00h00 - Atualizado às 12h00


Após a denúncia do garimpo ilegal de chumbo que funciona na área de uma antiga fábrica de baterias, em Sorocaba (SP), moradores foram vistos no terreno na manhã desta segunda-feira (20), por volta das 6h. Em busca de dinheiro “fácil”, pessoas se arriscam cavando a terra contaminada por produtos químicos para vender os metais em ferros-velho da cidade.

A denúncia exibida no Fantástico deste domingo (19) mostrou que, enquanto a equipe de reportagem estava no local, na última sexta-feira (17), um representante da Companhia Ambiental do Estado (Cetesb) apareceu na área.

Em nota à TV TEM, o órgão estadual informou que multou os responsáveis pela massa falida da Satúrnia em R$ 275 mil pela contaminação do terreno e falta de providências para eliminar o risco potencial a saúde.

A Cesteb afirma que vai oficializar na Justiça e na prefeitura a situação do local, que exige interdição e instalação de vigilância para impedir o acesso de pessoas não autorizadas. A Secretaria de Meio Ambiente também foi notificada pelo órgão para acelerar o processo afim de eliminar a situação de risco.

O Ministério Público informou que vai pedir que a Prefeitura de Sorocaba interdite o terreno da antiga fábrica de baterias. A área onde estão os restos de baterias e lixo tóxico fica no bairro Iporanga, escondida por um matagal, e tem livre acesso.

Em nota, a Prefeitura de Sorocaba afirmou que solicitou ao setor Jurídico que avalie o caso junto ao MP, e que entende ser necessário punir os responsáveis pelos danos causados ao meio ambiente.

Flagrante

Com câmeras escondidas, os produtores da TV TEM e do G1 flagraram dezenas de pessoas escavando o terreno. Do alto é possível ter uma ideia do tamanho da área que já foi revirada por pás, enxadas e até máquinas.

Sem saber que estava sendo filmado, um homem, que teve a identidade preservada, explicou como funciona o esquema de extração no terreno.

“Você bate o martelo e se ela [pedra] não quebrar, é pura. É R$ 4 o quilo. Você só não pode chegar perto de lá, porque tem uma fumaça saindo ali embaixo da terra. Tem lugar que você vai e arde o olho”, diz.

Garimbo foi descorto em Sorocaba  (Foto: Carlos Dias/G1)

Garimbo foi descorto em Sorocaba (Foto: Carlos Dias/G1)

Metais tóxicos

A reportagem recolheu algumas pedras que foram submetidas a análise laboratorial. Segundo o toxicologista da Universidade de São Paulo (USP) Fernando Barbosa Júnior, cinco tipos de metais prejudiciais à saúde foram identificados.

“As amostras apresentaram valores extremamente elevados de chumbo. Um milhão de vezes superiores àquelas que nós esperaríamos. Além do chumbo, foram encontrados alumínio, cádmio, cromo e arsênio.”

O especialista explica que esses metais pesados entram no organismo pelo nariz e pela boca na poeira levantada no garimpo. Com o tempo, podem surgir doenças cardiovasculares, hepáticas e do sistema nervoso.

O cromo, o arsênio e o cádmio se acumulam nos rins e em doses altas podem levar à falência desses órgãos. O cromo e o arsênio também podem causar câncer.E a contaminação por alumínio faz tão mal para o cérebro que cientistas estudam hoje se ele pode estar ligado ao alzheimer.

‘Herança’ da falência

O terreno onde ocorre o garimpo pertencia a uma das maiores fábricas de baterias industriais e de automóveis do país: a Saturnia. O chumbo é um dos principais componentes da fabricação. Quando uma bateria acaba, ela volta para a indústria para ser reciclada. No entanto, o que deveria ser um processo de reciclagem, se transformou em um grave crime ambiental.

Um ex-funcionário, que não terá a identidade revelada, contou como era o esquema:

“A bateria chegava, eles despejavam no pátio e lá abriam no machado para escorrer todo o ácido que tem na bateria. O ácido ia para o chão mesmo. Depois, catavam as placas da bateria e jogavam em uma caçamba e despejava no forno.”

Em seguida, o material era derretido e o chumbo separado. A sobra, que é chamada de “escória”, era enterrada atrás do barracão. “A máquina aterrava, depois cobria e abria outro buraco de novo. Dia e noite”, afirma o ex-funcionário.

A engenheira química Fabíola Ribeiro afirma que este tipo de descarte é totalmente irregular.

“Eles precisam ser encaminhados para o que a gente chama de uma disposição final adequada, a exemplo de um aterro de resíduos perigosos, e nunca diretamente no solo sem nenhum tipo de prevenção e controle da poluição”, explica.

No terreno de uma fábrica abandonada, em Sorocaba, no interior de SP, pessoas desesperadas estão se arriscando para encontrar chumbo (Foto: Reprodução/Globo)

No terreno de uma fábrica abandonada, em Sorocaba, no interior de SP, pessoas desesperadas estão se arriscando para encontrar chumbo (Foto: Reprodução/Globo)

Saturnia funcionou por 39 anos e fechou em 2011. Em 2016, a fábrica decretou falência. Desde então, tudo ficou abandonado. O advogado responsável pela empresa foi procurado pela reportagem, mas não atendeu às ligações.

Em dezembro de 2017, a Cetesb fez um laudo e identificou a contaminação por chumbo de todo o solo da fábrica, mas nada foi feito.

A informação sobre a então possível contaminação do solo chegou a ser tema de apuração da comissão de Meio Ambiente da Câmara de Sorocaba.

Após a denúncia ser levada ao Ministério Público e Companhia Ambiental do Estado (Cetesb), em maio deste ano, a Justiça determinou que a empresa estadual retirasse o material químico do terreno. Entretanto, a Cetesb informou, na época, que não tinha funcionários e nem local para armazenar os produtos.

Pedras de chumbo são vendidas em ferros-velho na região de Sorocaba (Foto: Reprodução/TV TEM)

Pedras de chumbo são vendidas em ferros-velho na região de Sorocaba (Foto: Reprodução/TV TEM)

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